Conto

To Be Or Not To Be

1876
Este conto foi originalmente publicado no Jornal das Famílias em fevereiro e março de 1876, assinado por Machado de Assis. O texto desta edição eletrônica foi cotejado com o da publicação original.

III

Era claro que a viúva Cláudia gostava do rapaz; trocou com ele um longo e expressivo olhar e dignou-se responder com um sorriso ao sorriso que André Soares lhe enviou.

Quando ele de todo desapareceu, Cláudia entrou para dentro e foi tocar piano. Não escolheu um trecho alegre adequado à situação; preferiu uma melodia triste que parecia dizer com a sua alma, ou ao menos que ela queria que se parecesse com ela. O certo é que, voltando daí a pouco André Soares e ouvindo-a tocar cousas tão melancólicas, sentiu acordar-lhe dentro d`alma um som poético da sua adolescência e logo nesta noite expectorou uma elegia tão triste que não trazia um verso certo.

A primeira carta não se fez demorar, e a resposta foi imediatamente às mãos do namorado. Não era carta apaixonada a da moça, mas André Soares compreendeu que ela usara de certa reserva que lhe parecia necessária. Replicou o pretendente, treplicou a dama, e os autos de coração foram-se avolumando progressivamente, até que André Soares entendeu que era conveniente frequentar a casa e aproveitou uma apresentação que lhe ofereceram.

A primeira vez que se falaram os dois foi visível para o Sr. Justino Magalhães, irmão de Cláudia, que eles se amavam.

Justino Magalhães tinha um programa na vida: agradar aos pretendentes da irmã, a fim de poder continuar a viver economicamente, isto é, a ter casa e mesa sem despender um real. Fiel a estas ideias, tratou de captar a boa vontade de André Soares, que por sua parte atirou-se de corpo e alma aos braços do futuro cunhado.

Cláudia era ainda mais bela de perto que de longe; o namorado verificou logo essa diferença quando começou a frequentar a casa. A moça era sobretudo de uma meiguice incomparável. André Soares ficava encantado quando falavam algum tempo a sós, e ela podia expandir-se com ele.

- Mas por que motivo me distinguiu logo naquele dia na barca? - perguntara André uma noite à moça.

- Ora, por quê? Porque o céu nos destinava um para o outro.

- E se soubesse!...

- O quê?

- Não lhe digo.

- Receia?...

- Nada; tenho vergonha. Naquele fatal dia...

- Fatal... - repetiu a moça com um ar de doce ressentimento.

- Perdão; fatal por outro motivo, que eu só mais tarde lhe explicarei... Sim, há anjos que velam por nós.

- Há! - suspirou a moça.

A conversa foi interrompida por Justino, que se aproximou para dizer que no dia seguinte havia um bonito espetáculo no teatro de São Luís.

André Soares recebera justamente nesse dia o ordenado; era ocasião de fazer um convite.

- Tenho justamente camarote para amanhã - disse ele -; se quiserem dar-me a honra de aceitar...

- Mas... - ia ela dizendo.

- Com muito gosto - atalhou Justino.

O camarote foi aceito.

Mas a curiosidade da moça trabalhava. Que mistério seria esse de que lhe falara André Soares? Insistiu com ele dali a algum tempo, e no dia seguinte, e alguns dias depois, até que o namorado francamente confessou que um motivo grave o levara a cometer um crime.

- Um crime?

- A minha própria morte.

A moça ficou séria.

- Alguma paixão - disse ela com tristeza.

- Oh! Não!

- Não compreendo...

- Que quer? - disse ele -. Nem só de pão vive o homem; achava-me numa situação pecuniária desagradável e... mas para que falaremos de cousas mesquinhas?...

André Soares calou-se e entrou a refletir; pareceu-lhe que fora expansivo demais e que acabava de dar à namorada a ideia de pinga. Igualmente lhe pareceu que um pinga só é poético nos livros, mas que na vida real toda a gente o despreza. E refletiu enfim que, apresentando-se candidato à mão da viúva, cumpria-lhe mostrar que não ia só atrás das suas apólices...

O resultado de todas estas reflexões produziu esta observação:

- Felizmente, lá vai esse tempo; foi uma crise que passou. Agora...

- Não desejo saber isso - disse a moça -; por que não falaremos só do nosso coração?

- É apenas um parêntesis necessário - disse André Soares -, é-me preciso explicar-lhe a razão por que até hoje não lhe pedi oficialmente a sua mão.

A moça fez um gesto.

André continuou:

- Não lhe pedi a sua mão porque espero obter um novo lugar que me coloque com situação melhor do que atualmente me acho. Não é ela má! Lembro-lhe porém que sou solteiro; casado, seria insuficiente. Peço-lhe desculpa de entrar nestes pormenores; é uma senhora de juízo; e há de aceitá-los como cabidos e necessários.

- Nem cabidos nem necessários - disse a moça -; eu pouco tenho, mas tenho alguma cousa...

- Perdão...

- Ouça...

- Desejo observar...

- Ouça. O seu pouco com o meu pouco farão o necessário para a nossa existência. Duas criaturas que se amam são naturalmente econômicas das cousas da vida.

André Soares teve ímpeto de cair aos pés da moça e ir dali com ela para a igreja.

Conteve-se do primeiro movimento.

O segundo era impossível.

- O que me acaba de dizer é a expressão elevada e nobre de seu coração - disse ele -. Eu porém não tenho o direito de falar a mesma linguagem; a sociedade exige mais de mim. Peço-lhe só alguns dias de espera.

André Soares pedira efetivamente um novo emprego, e desta vez, se não havia mais probabilidade que da outra, havia mais esperanças no fácil espírito do pretendente.

Justino soube pela irmã das razões dadas por André Soares, e achou que eram de cavalheiro.

- É um rapaz muito simpático - disse Justino -; é um homem como há poucos.

Esta opinião de Justino não devia produzir impressão no ânimo de Cláudia, porque ele não tinha outra a respeito de todos os pretendentes da irmã.

Todavia entusiasmou-a.

E a razão é clara.

Cláudia gostava realmente do rapaz; e o seu coração não se lembrava ou não reparava na opinião uniforme de Justino a respeito de outras pessoas que a pretendessem mas a quem ela nunca dera atenção.

Justino, porém, insistiu na opinião que formara de André Soares, e tão cavalheiro o achou que não teve dúvida de lhe pedir vinte mil-réis no dia seguinte.

Não era a primeira vez que Justino recorria à bolsa de André Soares, e porque isso, e outras necessidades que agora lhe acresciam, aumentavam as despesas de André Soares, ia este sendo obrigado a recorrer à bolsa de outros, e a criar assim uma dívida externa assaz vasta.

E tão triste é esta situação que eu não tenho ânimo de continuar o capítulo. Veremos no capítulo seguinte o que aconteceu ao nosso herói.

IV

Vão passados cinco meses depois da conversa em que André Soares expôs à sua amada qual era a situação da vida e quais os seus projetos.

Os dias foram passando sem vir o emprego; André Soares passava já uma vida assaz triste e lastimosa. A moça pela sua parte, conquanto desejasse repetir-lhe o que uma vez lhe dissera, não se atrevia a fazê-lo, a fim de conservar a reserva que a sua posição lhe impunha.

Redobrava entretanto de carinhos e afeto com o mísero namorado, o que de algum modo lhe suavizava as penas do coração.

- Que anjo! - dizia ele todas as noites ao retirar-se para casa -. Que anjo!

Se o emprego não vinha, em compensação chegavam as dívidas, e o passivo de André Soares ia tomando um aspecto assustador.

Ao mesmo tempo o amor do pobre rapaz, se era possível, crescia mais, o que estava longe de ser um lenitivo naquela situação. A ideia de não poder casar com a bela viúva, ou de casar nas condições em que ele se achava, atormentava o espírito do pobre moço.

Imagine-se o que sofreria o coração do pobre rapaz e calcule-se em que circunstâncias, e com que cara ouviu ele um dia, ao passar pela padaria de que falei no segundo capítulo, as seguintes palavras do caixeiro a um vizinho:

- Este é uma das duas amarras da viuvinha.

André ficou sem pinga de sangue. Naturalmente ia voltar o rosto, mas a tempo deteve o movimento e continuou a andar até entrar na casa da viúva Cláudia.

Parou entretanto no corredor antes de subir as escadas.

E refletiu:

- Que será aquilo? Iludir-me-á esta mulher? Serei eu a fábula da rua? Terei eu um rival mais venturoso?

Estas e outras interrogações, fê-las o nosso herói com o desespero na alma e no rosto.

Sentiu depois uma dor aguda no peito e teve uma vertigem.

O desgraçado padecia deveras, amava deveras.

Enfim subiu.

Cláudia recebeu-o com o modo do costume, o qual modo havia já vinte dias que não era o mesmo modo anterior. O mísero namorado entretanto não dera por isso até então.

Naquele dia, porém, como já tinha a pulga atrás da orelha, notou uma grande diferença, irritou-se com ela, disse algumas palavras secas à moça e saiu. Calcula-se facilmente qual seria a noite do pobre rapaz. No dia seguinte enviou uma lacrimosa epístola à sua dama, dizendo-lhe:

Cláudia:

Uma terrível revelação me foi feita ontem. Ainda assim quero crer em ti. Preciso porém que me jures se realmente me amas ou se eu já não mereço da tua parte o afeto com que me honraste outrora.

Dois dias esperou a resposta desta carta. No terceiro apareceu-lhe em casa Justino. Vinha alegre. Trocaram algumas palavras banais, e enfim:

- Sei que você escreveu uma carta a minha mana - disse o irmão da viúva.

- É verdade.

- Cláudia riu-se quando a leu.

- Riu-se?

- É verdade: riu-se. E não devia fazer outra cousa... Dá cá um charuto... Não devia fazer outra cousa, porque, no ponto em que se acham as cousas entre ambos, exigir agora uma explicação daquela ordem.... é singular.

Justino concluía estas palavras e recebia das mãos de André Soares o charuto que pedira.

André Soares não cabia em si de contente.

- Então, ela?

- Você é um visionário, um crédulo, um rapazola sem juízo. Pois então uma senhora em vésperas de casar com você... Que bom charuto!

- Leve mais estes.

- Obrigado. Como ia dizendo, uma senhora em vésperas de casar por sua livre vontade, há de lá... Você é um doudo!...

André Soares concordou facilmente com tudo o que lhe dizia Justino, e prometeu que nessa mesma noite iria à casa deles. Recusou entretanto dizer donde lhe viera a revelação a que aludira na carta.

Justino conversou largo tempo com o futuro cunhado, de quem se despediu para ir embora.

- Já!

- Já! Vou pagar uma dívida. Vejamos se me chega o dinheiro.

E meteu a mão no bolso do paletó com a confiança de um homem que traz a carteira. Errada confiança, porque a carteira ficara em casa.

- Não seja essa dúvida - disse André Soares -; eu empresto-lhe o que for preciso, se não orçar por muito!

- Trinta e cinco mil e quinhentos - disse Justino.

- Tome lá - acudiu André Soares entregando-lhe trinta e dois mil-réis -. Não tenho mais.

- Não faz mal. Para tapar a boca ao credor, cuido que é bastante.

Justino saiu alegremente depois de muitas amabilidades ao futuro cunhado, que não menos alegre ficou.

A cena que precede deve ter explicação.

Cláudia não mostrou a carta de André Soares ao irmão. Viu-a este sobre uma mesa, perguntou à viúva o que era, e esta disse então um tanto zangada que eram ciúmes do noivo.

- Posso ler?

- Lê.

Leu a carta Justino e ofereceu-se para ir entender-se com André Soares, cousa que a viúva nem aprovou nem reprovou; limitou-se a encolher os ombros.

André não era homem que descobrisse na missão de Justino a necessidade de trinta e cinco mil-réis, e a dívida, que podia existir, mas que, em todo o caso, não ia ser paga, pareceu-lhe tão autêntica, que iria pedir emprestado se não tivesse dinheiro para favorecer o amigo.

Ao chegar à casa da noiva ia André Soares todo trêmulo de comoção. A moça, entretanto, pareceu-lhe ainda mais fria que da última vez. Atribuiu isso ao ressentimento que lhe deixara a carta.

- Mas então não perdoa? - perguntou ele.

- O quê?

- A carta.

Cláudia levantou os ombros.

- Foi uma imprudência, confesso - disse ele -; mas que quer? Eu amo-a.

Nada.

- Aproveito a ocasião para lhe dizer que daqui a um mês será o nosso casamento - disse André Soares -, se acaso a ele se não opõe.

Cláudia ficou um pouco surpreendida com a notícia, continuou entretanto a ficar calada.

André Soares saiu vendendo azeite às canadas.

"Há alguma cousa, por força" pensava ele, "mas eu hei de descobrir tudo!"

V

André Soares começou então uma vida de pesquisas e de cuidados, cuidados e pesquisas tais que o obrigaram a ir faltando à repartição, faltando-lhe igualmente a paz e o sono. Fazia ronda de tarde e de noite, passava horas e horas em casa da noiva sem todavia alcançar nada.

Uma vez apenas reparou que, ouvindo bater cinco horas, a moça interrompera a conversa para ir à janela. Ficou aflito na cadeira em que se achava, receoso e desejoso de ir também àquela. Afinal foi, mas não viu nada porque a moça saiu logo.

Nesta atribulada vida andava André Soares, quando, num domingo, entrando em casa de Cláudia, deu com os olhos num sujeito da sua mesma idade, alto, bonito, vestido regularmente e muito respeitoso para com a interessante viúva.

Justino apresentou os dois estranhos um ao outro, donde veio André Soares a saber que o outro chamava-se Horácio.

Eu creio que a leitora é perspicaz e que já está a desconfiar de que este Horácio é o mesmo moço que o caixeiro da padaria dissera a André Soares ter andado há algum tempo a namorar a viúva, e não ser mal aceito dela.

Não o soube logo André Soares; mas a simples presença de um estranho, as maneiras com que tratava a moça, e a benevolência e gosto com que esta o ouvia e lhe respondia, tudo isso era razão para que o pobre namorado recebesse logo um imenso golpe.

As torturas por que passou nessa tarde foram indescritíveis.

No dia seguinte ainda foi pior. Oito dias depois tinha André Soares toda a certeza de que a bela passara com armas e bagagens ao campo inimigo.

Algumas cousas fortes lhe disse, a que ela respondeu com o silêncio; foi para casa e escreveu uma longa, indignada, lagrimejada e fulminante carta, a que a moça não respondeu.

Seu desespero já não tinha limites.

- Por que fatal acaso encontrei eu aquela mulher? - perguntava ele a passear sozinho na sua sala -. Parecia então que nada pior me podia acontecer. Erro! Havia pior; essa víbora que zombou de mim.

E logo:

- Mas eu hei de tirar vingança! Não se dirá que fui ludibriado por ambos ou antes por todos três, porque o Justino também contribuiu para iludir-me. Venha ainda alguma vez pedir-me alguma cousa...

Aqui claudicava a perspicácia do namorado.

Justino nada mais lhe pedira desde o dia dos trinta e dois mil-réis.

Era então a carteira de Horácio que se incumbira de corrigir as lacunas que às vezes havia na sua. Justino o mais que fazia era pedir uma ou outra vez algum charuto ao André Soares.

Nada mais.

André Soares entendeu que lhe cumpria pedir satisfações a Horácio. Refletiu depois e preferiu ocultar o que entre ele e ela havia; não dispensou porém brigar com o rival.

Para isto bastava um pretexto.

Mas que pretexto seria?

"Ora, adeus!", pensou ele consigo. "A ocasião me dará o pretexto."

Logo no dia seguinte entrando, numa casa de charutos, encontrou Horácio, a quem ligeiramente cumprimentou.

Horácio pareceu não fazer caso dele.

André Soares foi às nuvens.

Depois de um silêncio:

- Vai hoje à Rua dos Inválidos?

- Sim, senhor - respondeu secamente Horácio.

- Há muito tempo já que conhece aquela família?

Horácio olhou para ele sem dignar-se responder.

- Não me ouviu, creio eu.

- Estou a recordar-me do tempo - disse Horácio depois de alguns instantes -. Creio que conheço aquela família desde o tempo em que a casa não era frequentada por tolos.

André Soares ficou vermelho como um lacre; todavia era preciso responder.

- Então não há muito tempo - disse ele; creio que entraram juntos lá os tolos e o senhor.

Horácio foi sacudido com esta resposta. As palavras trocadas em voz alta chamaram a atenção do dono da casa. A tragédia estava iminente.

Horácio tinha dois caminhos.

O primeiro era ir-se embora.

O segundo era ir-lhe às orelhas.

Preferiu o segundo.

Encaminhou-se para André Soares; alçou delicadamente as mãos às orelhas dele; agarrou-lhas, sacudiu-lhe a cabeça e, antes que o infeliz tivesse tempo de se defender, saiu pela porta fora.

André Soares ainda saiu à rua, mas fosse medo, vergonha, ou qualquer outra causa, não se atreveu a ir brigar com ele em público; limitou-se a tomar os nomes do dono da casa e do caixeiro para o caso de dar queixa contra o agressor, e saiu dali para casa.

Em caminho porém teve ideia de ir à casa da viúva.

"É claro que eles se amam", pensou ele; "mas eu preciso antes de abater as armas mostrar o que sou e o que valho. Hei de dizer a essa pérfida aquilo que ela não pensa ouvir."

Estava André Soares em plena regateirice; nem eu o dou por frequentador de salões aristocráticos. Demais, o amor faz perder o juízo.

André Soares caminhou direito à casa da viuvinha.

Bateu palmas.

Nada.

Repetiu as palmas.

A mesma cousa.

"Que será? Estará fora?" pensou ele.

Enfim vieram ver quem era. André Soares disse que desejava falar à dona da casa.

- Está incomodada.

- Mas... diga-lhe que sou eu.

- Não recebe ninguém.

André Soares saiu dali ainda mais furioso. Mil ideias negras lhe transtornavam o espírito; só via diante de si mortes, sangue, cadafalso.

Ao chegar a casa achou duas cartas.

Uma era de Cláudia.

Dizia assim:

Nunca chegamos a nenhum acordo acerca de casamento, mas, sabendo que nutre ideias a esse respeito, declaro-lhe que desista delas.

- Despedido! - exclamava o mísero André Soares -. Despedido como um lacaio!... Insultado por ele e por ela. Oh! Minha sina! Oh! Minha triste sina!

Assim falando, o infeliz namorado torcia-se todo, puxava os cabelos, rangia os dentes, e chorava de dor, de desespero e de ódio.

No meio dessa crise, lembrou-lhe o criado que ainda havia outra carta.

Abriu-a.

Era do chefe da repartição.

Participava-lhe que, não comparecendo ele com a assiduidade de costume, antes fugindo absolutamente do trabalho, resolvera o ministro demiti-lo.

André Soares caiu sem sentidos no chão.

Um mês depois, estando a almoçar pacificamente no Carceller, graças ao crédito que obtivera de um amigo e antigo companheiro de casa, viu passar Horácio e a viúva de braço dado.

Estavam casados.

- Miseráveis! - grunhiu André Soares.

MORALIDADE

"Mas onde está a moralidade do conto?" pergunta a leitora espantada com ver esta série de acontecimentos descosidos e vulgares.

A moralidade está nisso.

Tendo perdido a esperança de obter um emprego de duzentos mil-réis, quando apenas desfrutava um de cento e vinte, assentou André Soares de dar cabo da vida.

No dia porém em que perdeu a noiva e o emprego de cento e vinte mil-réis, com um insulto físico de quebra, não se matou, nem tentou matar-se, nem se lembrou de o fazer.

Tanto é certo que o suicídio depende mais das impressões e disposições do momento, que da gravidade do mal.

Disse.

A+
A-