Ressurreição
NOTA DESTA EDIÇÃO ELETRÔNICA
Ressurreição é o primeiro romance publicado por Machado de Assis, em 1872. Durante a vida do autor, saiu mais uma edição, em 1905, também pela casa editora Garnier.
Para cada uma dessas edições, o autor escreveu uma "Advertência": na primeira, que assina (M. A.) e data de 17 de abril de 1872, explica o propósito do livro e, recorrendo a Shakespeare, que traduz em nota de rodapé, declara que vai escrever um livro sobre a questão da dúvida; na segunda, que assina (M. de A.) e não data, a advertência é bem mais curta e, ao reproduzir a "Advertência da 1a. Edição", já não fornece a tradução que constava na publicação de 1872.
Agora autor consagrado, Machado reflete sobre o seu romance de estreia e declara que não "lhe alter[a] a composição nem o estilo", apenas troca alguns vocábulos e faz pequenas correções de ortografia. No entanto, pode o leitor atento perceber a ausência, na segunda edição, da tradução dos versos de Shakespeare, como se o autor maduro se eximisse da tarefa de traduzir, e, por esse expediente, elevasse a si mesmo e ao seu público-leitor, que pressupõe apto a dispensar a versão para o português da passagem shakespeariana. Ganha em sutileza, dá mais trabalho ao leitor, cuja recepção continua manipulando, mas de maneira mais sorrateira.
Sem investigar em profundidade as possíveis outras motivações da ausência da tradução na edição de 1905, deixamos ao leitor de 2008 uma provocação, um convite a pensar sobre essa obra que, pertencendo à "primeira fase" - como ele próprio assinala na abertura da segunda edição - guarda mais mistérios do que se poderia pensar à primeira vista.
Para estabelecer o texto da presente edição eletrônica, utilizamos como fonte a edição Garnier / Fundação Casa de Rui Barbosa de 1988, preparada por José Galante de Sousa, que se baseou na segunda edição da obra (1905), a última em vida do escritor e, portanto, autorizada por ele. Para solucionar eventuais dúvidas, recorremos diretamente a exemplares da primeira e da segunda edições, existentes na biblioteca da Fundação Casa de Rui Barbosa.
Foi feita uma atualização ortográfica, mas mantivemos formas que, embora em desuso atualmente, ainda são consignadas pelos principais dicionários de língua portuguesa ("cousa", "cômplice" "cepticismo"). Em nome da preservação do que se poderia chamar de "atmosfera textual", conservamos na língua de origem palavras estrangeiras como "tilbury" e "champagne", apesar de já existirem consignadas em dicionários atuais na forma aportuguesada ("tílburi", "champanhe"). Do mesmo modo, deixamos as duas formas "noute" (uma ocorrência) e "noite" (mais de trinta), por supor que, na fala em que se encontra a forma antiga ("noute"), é possível que Machado de Assis a tenha empregado deliberadamente, como um traço do registro um tanto artificial da personagem que a emprega.
Talvez o maior problema no estabelecimento de textos escritos no século XIX seja o da pontuação. Ao preparar esta edição, optamos por uma política a meio caminho entre uma atualização radical, de acordo com as normas presentemente vigentes, e o respeito à pontuação de Machado de Assis. Para citar um exemplo apenas: mantivemos todas as vírgulas antes da aditiva "e" precedendo verbos cujo sujeito era precisamente o mesmo da oração anterior ("Félix deu uma volta pelo interior da casa, e foi até à sala [...]"). Assim deliberamos por identificar no procedimento um traço estilístico recorrente no romance. Por outro lado, nos casos em que consideramos que a vírgula (ou a ausência dela) comprometia o melhor entendimento do texto, não hesitamos em intervir, como ocorreu no caso de vírgulas precedendo orações adjetivas restritivas (que suprimimos) e de falta de vírgulas precedendo orações adjetivas explicativas (que inserimos). Num caso apenas, deixamos a vírgula separando o sujeito de seu verbo ("O que está feito, está feito."), por considerar que a pontuação procura reproduzir, na fala da personagem, a pausa própria da oralidade.
Esta não pretende ser uma edição crítica. Nosso objetivo foi produzir uma edição fidedigna do texto machadiano que, através dos hiperlinks, oferece ao leitor do século XXI uma ferramenta de fácil utilização e encurta a distância entre ele, leitor, e o enorme universo de referências de Machado de Assis.
Registre-se aqui a colaboração, na pesquisa dos hiperlinks, de Camila Abreu, ex-bolsista de Iniciação Científica na Fundação Casa de Rui Barbosa; na revisão, a de Ana Maria Vasconcelos e Karen Nascimento, bolsistas de Iniciação Científica, e, na construção do texto digital e do software que possibilita a visualização dos links, a de Eduardo Pinheiro da Costa, técnico em informática da Fundação Casa de Rui Barbosa.
ADVERTÊNCIA DA NOVA EDIÇÃO
Este foi o meu primeiro romance, escrito aí vão muitos anos. Dado em nova edição, não lhe altero a composição nem o estilo, apenas troco dous ou três vocábulos, e faço tais ou quais correções de ortografia. Como outros que vieram depois, e alguns contos e novelas de então, pertence à primeira fase da minha vida literária.
ADVERTÊNCIA DA PRIMEIRA EDIÇÃO
Não sei o que deva pensar deste livro; ignoro sobretudo o que pensará dele o leitor. A benevolência com que foi recebido um volume de contos e novelas, que há dous anos publiquei, me animou a escrevê-lo. É um ensaio. Vai despretensiosamente às mãos da crítica e do público, que o tratarão com a justiça que merecer.
A crítica desconfia sempre da modéstia dos prólogos, e tem razão. Geralmente são arrebiques de dama elegante, que se vê ou se crê bonita, e quer assim realçar as graças naturais. Eu fujo e benzo-me três vezes quando encaro alguns desses prefácios contritos e singelos, que trazem os olhos no pó da sua humildade, e o coração nos píncaros da sua ambição. Quem só lhes vê os olhos, e lhes diz verdade que amargue, arrisca-se a descair no conceito do autor, sem embargo da humildade que ele mesmo confessou, e da justiça que pediu.
Ora pois, eu atrevo-me a dizer à boa e sisuda crítica que este prólogo não se parece com esses prólogos. Venho apresentar-lhe um ensaio em gênero novo para mim, e desejo saber se alguma qualidade me chama para ele, ou se todas me faltam - em cujo caso, como em outro campo já tenho trabalhado com alguma aprovação, a ele volverei cuidados e esforços. O que eu peço à crítica vem a ser - intenção benévola, mas expressão franca e justa. Aplausos, quando os não fundamenta o mérito, afagam certamente o espírito, e dão algum verniz de celebridade; mas quem tem vontade de aprender e quer fazer alguma cousa, prefere a lição que melhora ao ruído que lisonjeia.
No extremo verdor dos anos presumimos muito de nós, e nada ou quase nada, nos parece escabroso ou impossível. Mas o tempo, que é bom mestre, vem diminuir tamanha confiança, deixando-nos apenas a que é indispensável a todo o homem, e dissipando a outra, a confiança pérfida e cega. Com o tempo, adquire a reflexão o seu império, e eu incluo no tempo a condição do estudo, sem o qual o espírito fica em perpétua infância.
Dá-se então o contrário do que era dantes. Quanto mais versamos os modelos, penetramos as leis do gosto e da arte, compreendemos a extensão da responsabilidade, tanto mais se nos acanham as mãos e o espírito, posto que isso mesmo nos esperte a ambição, não já presunçosa, senão refletida. Esta não é talvez a lei dos gênios, a quem a natureza deu o poder quase inconsciente das supremas audácias; mas é, penso eu, a lei das aptidões médias, a regra geral das inteligências mínimas.
Eu cheguei já a esse tempo. Grato às afáveis palavras com que juízes benévolos me têm animado, nem por isso deixo de hesitar, e muito. Cada dia que passa me faz conhecer melhor o agro destas tarefas literárias - nobres e consoladoras, é certo, mas difíceis quando as perfaz a consciência.
Minha ideia ao escrever este livro foi pôr em ação aquele pensamento de Shakespeare:
Our doubts are traitors
And make us lose the good we oft might win
By fearing to attempt.
Não quis fazer romance de costumes; tentei o esboço de uma situação e o contraste de dous caracteres; com esses simples elementos busquei o interesse do livro. A crítica decidirá se a obra corresponde ao intuito, e sobretudo se o operário tem jeito para ela.
É o que lhe peço com o coração nas mãos.
I
NO DIA DE ANO-BOM
Naquele dia - já lá vão dez anos! - o Dr. Félix levantou-se tarde, abriu a janela e cumprimentou o sol. O dia estava esplêndido; uma fresca bafagem do mar vinha quebrar um pouco os ardores do estio; algumas raras nuvenzinhas brancas, finas e transparentes, se destacavam no azul do céu. Chilreavam na chácara vizinha à casa do doutor algumas aves afeitas à vida semiurbana, semissilvestre que lhes pode oferecer uma chácara nas Laranjeiras. Parecia que toda a natureza colaborava na inauguração do ano. Aqueles para quem a idade já desfez o viço dos primeiros tempos não se terão esquecido do fervor com que esse dia é saudado na meninice e na adolescência. Tudo nos parece melhor e mais belo - fruto da nossa ilusão - e, alegres com vermos o ano que desponta, não reparamos que ele é também um passo para a morte.
Teria esta última ideia entrado no espírito de Félix, ao contemplar a magnificência do céu e os esplendores da luz? Certo é que uma nuvem ligeira pareceu toldar-lhe a fronte. Félix embebeu os olhos no horizonte e ficou largo tempo imóvel e absorto, como se interrogasse o futuro ou revolvesse o passado. Depois, fez um gesto de tédio, e parecendo envergonhado de se ter entregue à contemplação interior de alguma quimera, desceu rapidamente à prosa, acendeu um charuto, e esperou tranquilamente a hora do almoço.
Félix entrava então nos seus trinta e seis anos, idade em que muitos já são pais de família, e alguns, homens de Estado. Aquele era apenas um rapaz vadio e desambicioso. A sua vida tinha sido uma singular mistura de elegia e melodrama; passara os primeiros anos da mocidade a suspirar por cousas fugitivas, e na ocasião em que parecia esquecido de Deus e dos homens, caiu-lhe nas mãos uma inesperada herança, que o levantou da pobreza. Só a Providência possui o segredo de não aborrecer com esses lances tão estafados no teatro.
Félix conhecera o trabalho no tempo em que precisava dele para viver; mas desde que alcançou os meios de não pensar no dia seguinte, entregou-se corpo e alma à serenidade do repouso. Mas entenda-se que não era esse repouso aquela existência apática e vegetativa dos ânimos indolentes; era, se assim me posso exprimir, um repouso ativo, composto de toda a espécie de ocupações elegantes e intelectuais que um homem na posição dele podia ter.
Não direi que fosse bonito, na significação mais ampla da palavra; mas tinha as feições corretas, a presença simpática, e reunia à graça natural a apurada elegância com que vestia. A cor do rosto era um tanto pálida, a pele lisa e fina. A fisionomia era plácida e indiferente, mal-alumiada por um olhar de ordinário frio, e não poucas vezes morto.
Do seu caráter e espírito melhor se conhecerá lendo estas páginas, e acompanhando o herói por entre as peripécias da singelíssima ação que empreendo narrar. Não se trata aqui de um caráter inteiriço, nem de um espírito lógico e igual a si mesmo; trata-se de um homem complexo, incoerente e caprichoso, em quem se reuniam opostos elementos, qualidades exclusivas, e defeitos inconciliáveis.
Duas faces tinha o seu espírito, e conquanto formassem um só rosto, eram todavia diversas entre si, uma natural e espontânea, outra calculada e sistemática. Ambas porém se mesclavam de modo que era difícil discriminá-las e defini-las. Naquele homem feito de sinceridade e afetação tudo se confundia e baralhava. Um jornalista do tempo, seu amigo, costumava compará-lo ao escudo de Aquiles mescla de estanho e ouro, "muito menos sólido", acrescentava ele. Aquele dia, aurora do ano, escolhera-o o nosso herói para ocaso de seus velhos amores. Não eram velhos; tinham apenas seis meses de idade. E contudo iam acabar sem saudade nem pena, não só porque já lhe pesavam, como também porque Félix lera pouco antes um livro de Henri Murger, em que achara um personagem com o sestro destas catástrofes prematuras. A dama dos seus pensamentos, como diria um poeta, recebia assim um golpe moral e literário.
Havia meia hora já que o doutor saíra da janela, quando lhe apareceu uma visita. Era um homem de quarenta anos, vestido com certo apuro, gesto ao mesmo tempo familiar e grave, estouvado e discreto.
- Entre, Sr. Viana - disse Félix quando o viu aparecer à porta da sala. Vem almoçar comigo, já sei.
- Esse é um dos três motivos da minha visita respondeu Viana -; mas afirmo-lhe que é o último.
- Qual é o primeiro?
- O primeiro - disse o recém-chegado - é dar-lhe o cumprimento de bons anos. Folgo que lhe corra este tão feliz como o passado. O segundo motivo é entregar-lhe uma carta do coronel.
Viana tirou uma cartinha da algibeira e entregou-a ao doutor, que a leu rapidamente.
- Creio que é um convite para o sarau de hoje? - perguntou Viana quando o viu dobrar a carta.
- É; transtorna-me um pouco, porque eu tencionava ir para a Tijuca.
- Não caia nessa - acudiu Viana -; eu era capaz de deixar todas as viagens do mundo só para não perder uma reunião do coronel; é um excelente homem, e dá boas festas. Vai?
Félix hesitou algum tempo.
- Olhe que eu venho incumbido de lhe destruir todas as objeções que fizer - disse Viana.
- Não faço nenhuma. O convite transtorna-me o programa; mas, apesar disso, aceito.
- Ainda bem!
Um moleque veio dar parte de que o almoço estava na mesa. Viana descalçou as luvas e acompanhou o anfitrião.
- Que novidades há? - perguntou Félix sentando-se à mesa.
- Nada que me conste - respondeu Viana imitando o dono da casa; o Rio de Janeiro vai a pior.
- Sim?
- É verdade; já não aparece um escândalo. Vivemos em completa abstinência, e chegou o reinado da virtude. Olhe, eu sinto a nostalgia da imoralidade.
Viana era um homem essencialmente pacato com a mania de parecer libertino, mania que lhe resultava da frequência de alguns rapazes. Era casto por princípio e temperamento. Tinha a libertinagem do espírito, não a das ações. Fazia o seu epigrama contra as reputações duvidosas, mas não era capaz de perder nenhuma. E todavia, teria um secreto prazer se o acusassem de algum delito amoroso, e não defenderia com extremo calor a sua inocência, contradição que parece algum tanto absurda, mas que era natural.
Como Félix não lhe animasse a conversa no terreno em que ele a pôs, Viana entrou a elogiar-lhe os vinhos.
- Onde acha o senhor vinhos tão bons? - perguntou depois de esvaziar um cálix.
- Na minha algibeira.
- Tem razão; o dinheiro compra tudo, inclusive os bons vinhos.
A resposta de Félix foi um sorriso ambíguo, que podia ser benevolente ou malévolo, mas que pareceu não produzir impressão no hóspede. Viana era um parasita consumado, cujo estômago tinha mais capacidade que preconceitos, menos sensibilidade que disposições. Não se suponha, porém, que a pobreza o obrigasse ao ofício; possuía alguma cousa que herdara da mãe, e conservara religiosamente intacto, tendo até então vivido do rendimento de um emprego de que pedira demissão por motivo de dissidência com o seu chefe. Mas estes contrastes entre a fortuna e o caráter não são raros. Viana era um exemplo disso. Nasceu parasita como outros nascem anões. Era parasita por direito divino.
Não me parece provável que houvesse lido Sá de Miranda; todavia, punha em prática aquela máxima de um personagem do poeta: "boa cara, bom barrete e boas palavras custam pouco e valem muito..."
Chamando-lhe parasita não aludo só à circunstância de exercer a vocação gastronômica nas casas alheias. Viana era também o parasita da consideração e da amizade, o intruso polido e alegre, que, à força de arte e obstinação, conseguia tornar-se aceitável e querido, onde a princípio era recebido com tédio e frieza, um desses homens metediços e dobradiços que vão a toda a parte e conhecem todas as pessoas, "boa cara, bom barrete, boas palavras".
Parecendo-lhe que Félix estaria preocupado, Viana entendeu não dizer palavra antes de achar ocasião oportuna. Veio o café, e o primeiro que rompeu o silencio foi o doutor. Viana aproveitou habilmente o ensejo para reatar o fio dos louvores, tão asperamente quebrado pelo dono da casa. Não lhe elogiou desta vez os vinhos, mas as qualidades pessoais; afirmou-lhe que ninguém era mais querido na casa do coronel Morais, e que ele próprio não se recordava de pessoa a quem mais estimasse neste mundo.
- O senhor é tão feliz a este respeito - terminou o hóspede -, que até as pessoas que o não veem há muito conservam em toda a integridade o afeto que o senhor lhes inspirou. Adivinha de quem lhe falo?
- Não.
- Bem, sabê-lo-á de noite; lá verá em casa do coronel uma pessoa que o admira, e que o não vê há muito. Sejamos francos; é minha irmã Lívia.
- Admira-me isso, porque eu apenas a vi duas vezes.
- Não é possível - insistiu Viana -. Lembra-me que eu mesmo os apresentei um ao outro. Se não me engano foi em dia da Glória, há dous anos.
- Eu descia o outeiro - continuou Félix - quando os encontrei. Estivemos parados cinco minutos. À noite encontramo-nos em um baile; cumprimentamo-nos apenas e nada mais.
- Só isso?
- Nada mais.
- Nesse caso - concluiu Viana -, cuido que o senhor possui o segredo de fascinar as moças só com cinco minutos de conversa e um cumprimento de sala. Minha irmã fala muito no senhor; pelo menos depois que veio de Minas...
- Ah! Ela esteve em Minas?
- Foi para lá há perto de dous anos, depois que lhe morreu o marido. Veio há oito dias; sabe o que me propõe?
- Não.
- Uma viagem à Europa.
- E vão?
- Os desejos de Lívia são ordens para mim. Contudo, era talvez melhor que eu fosse só, porque uma senhora é sempre obstáculo aos desmandos de um pecador como eu. Não lhe parece?
- É então uma viagem de recreio? - perguntou Félix.
- Ou de romance; Lívia tem esse defeito capital: é romanesca. Traz a cabeça cheia de caraminholas, fruto naturalmente da solidão em que viveu nestes dous anos, e dos livros que há de ter lido. Faz pena, porque é boa alma.
- Vejo que tem todas as condições necessárias a um poeta - observou o doutor -; lembra-me que era bonita.
- Oh! A esse respeito a viuvez foi para ela uma renovação. Era bonita quando o senhor a viu; hoje está fascinante. Há ocasiões em que eu sinto ser irmão dela; tenho ímpeto de a adorar de joelhos. Com franqueza, assusta-me.
Leve sorriso encrespou os lábios de Félix, enquanto Viana prosseguia o panegírico da irmã, com um entusiasmo que podia ser sincero e interessado ao mesmo tempo. Ao fim de um quarto de hora levantou-se este para sair.
- Até à noite? - disse apertando a mão do dono da casa.
- Até à noite.
Félix ficou só.
- Que mulher será essa - perguntou a si mesmo -, tão bela que mete medo, tão fantasiosa que causa lástima?