Romance

Helena

1876

NOTA DESTA EDIÇÃO ELETRÔNICA

Helena, terceiro romance publicado por Machado de Assis, saiu pela primeira vez em livro em 1876. Em 1905, veio à luz a segunda edição, ainda em vida do autor, o que, em princípio, a tornaria o texto a partir do qual se deveria fazer a preparação de edições fidedignas do romance.

No entanto, por causa de uma gralha na impressão da primeira edição, logo na primeira frase do primeiro capítulo, a segunda edição consagrou, para as futuras, a data de abril de 1859 para a morte do conselheiro Vale, acontecimento que desencadeia toda a trama do romance. Na verdade, o ano só pode ser 1850, tal como está na primeira edição, embora o quadrante esquerdo inferior do algarismo zero, nessa edição, esteja mal impresso, quase apagado, e daí seja possível deduzir a origem do erro que se perpetuou em quase todas as edições seguintes. A data que Helena põe no desenho que oferece a Estácio no capítulo XI, julho de 1850, o comprova, indicando também que toda a ação se desenrola nesse ano.

O relato desse equívoco serve, quanto mais não seja, para indicar que, no trabalho de estabelecimento de textos literários, não pode haver regras fixas e que o melhor será sempre compulsar mais de uma edição. Assim, o procedimento aqui adotado foi tomar como fonte a primeira edição e, sempre que foram encontradas discrepâncias, consultar também a segunda (1905), a da Comissão Machado de Assis, de 1975, e a preparada por José Galante de Sousa e supervisionada por Adriano da Gama Kury, publicada em coedição pela Garnier (Belo Horizonte) e pelas Edições Casa de Rui Barbosa (Rio de Janeiro), em 1988.

A narrativa de Helena é de terceira pessoa onisciente, mas, como ocorre em outros romances de Machado, aqui e ali o narrador aflora no texto por meio de um pronome pessoal de primeira pessoa ou de um verbo flexionado, como em: "Eugênia desfiou uma historiazinha de toucador, que omito em suas particularidades por não interessar ao nosso caso [...]" (cap. V; itálicos nossos). Tal procedimento conduz, quase naturalmente, ao que se convencionou chamar de autoconsciência narrativa, ou seja, intromissões do narrador no próprio relato, alertando o leitor para este ou aquele fato, chamando sua atenção para este ou aquele desdobramento da história, para este ou aquele procedimento técnico. É o que ocorre, por exemplo, em: "Estácio referiu à tia a cena do capítulo anterior e as palavras que lhe dissera Helena" (cap. VII, itálicos nossos); ou em: "[Helena] ali sentou-se num sofá, e derreou levemente o corpo, deixando cair os cílios, não sei se pensativos, se pesados de sono (cap. XII; itálicos nossos). Esse procedimento, comum nos contos e romances de Machado de Assis (Quincas Borba é pródigo em exemplos) pode servir, paradoxalmente, a dois propósitos opostos: por um lado, chama a atenção para o livro como artefato, como algo que não é a realidade, levando o leitor a refletir que não está diante de uma janela aberta para o real e, sim, de uma obra de arte construída por um escritor; por outro, reforça a verossimilhança, quando o narrador finge não saber o que se esconde por trás das atitudes das personagens, como acontece na vida real, em que nunca podemos ter certeza do que pensam ou sentem as pessoas com quem convivemos.

A grande especificidade de Helena é, seguramente, o fato de o enredo ter no romance uma importância talvez inigualada no conjunto da obra machadiana, prendendo o leitor até o desenlace da trama, na qual se misturam uma boa dose de romantismo e uma espécie de desmentido dos determinismos naturalistas.

Na preparação deste texto, foram tomadas algumas decisões editoriais, das quais é preciso dar conta ao leitor. Períodos da história do Brasil ("Primeiro Reinado") bem como instituições ("Câmara dos Deputados") tiveram seus nomes escritos com inicial maiúscula. Pronomes de tratamento foram abreviados e grafados com maiúscula inicial ("Sr.", "Dr.", "D."), exceto quando em início de frase. Procuramos respeitar certas peculiaridades da linguagem machadiana como, por exemplo, o uso de "até ao" ou "até à", hoje em desuso no português do Brasil, mas comum em Portugal ainda no século XXI ("Helena estava de pé, no mesmo lugar, e percorria rapidamente as linhas, até ao final da última página".); ou o emprego do modo indicativo depois de "talvez" ("Talvez hesitava falar; talvez buscava o melhor meio de dizer o que tinha no coração."); ou o uso da grafia antiga de algumas palavras, desde que ainda consignadas nos principais dicionários brasileiros ("céptico", "gérmen"); ou, ainda, a utilização do pronome pessoal oblíquo "lhe" como sujeito do infinitivo, quando o uso gramaticalmente preconizado é o de "o" ("mas a segurança da moça logo lhe deixou ver [...]").

Como sempre, uma das maiores dificuldades é a pontuação. Ao preparar esta edição, optamos por uma política a meio caminho entre uma atualização radical, de acordo com as normas presentemente vigentes, e o respeito à pontuação de Machado de Assis, que, de resto, é comum aos escritores de língua portuguesa no século XIX. Para citar dois exemplos: mantivemos todas as vírgulas antes da aditiva "e" precedendo verbos cujo sujeito era precisamente o mesmo da oração anterior ("Helena ouvia com um sorriso, e respondia com um gracejo; [...]"); bem como as vírgulas em cujo uso percebemos um gesto estilístico ("O filho do conselheiro atravessou sozinho a chácara; ia pensativo, e aborrecido."). Diante da inconsistência no emprego / não emprego de vírgula depois de locuções adverbiais, às vezes dentro de um mesmo período, optamos por deixar como está nas edições consultadas ("De longe, via-a através da névoa luminosa da imaginação; ao pé era difícil que Eugênia conservasse os dotes que ele lhe emprestava."). Por outro lado, nos casos em que consideramos que a vírgula (ou a ausência dela) comprometia o melhor entendimento do texto, não hesitamos em intervir, como ocorreu no caso de vírgulas precedendo orações adjetivas restritivas (que suprimimos) e de falta de vírgulas precedendo orações adjetivas explicativas (que inserimos). Pelo mesmo motivo, assinalamos as elipses verbais com vírgula ("Tinha as feições duras e frias, os olhos, perscrutadores e sagazes, [...]").

Optamos por recorrer às aspas sempre que a "fala" de uma personagem é, na verdade, a expressão verbal de um pensamento que não chega a ser exteriorizado. Nos diálogos, foi preservado o travessão. Os numerais foram grafados por extenso, que é o uso predominante na prosa do autor. Adotou-se esse procedimento pelo mesmo motivo que se mantiveram em língua estrangeira os vocábulos assim escritos na primeira edição, por acreditar-se que tudo isso contribui para aquilo que se poderia chamar de "atmosfera textual" machadiana. Pelo mesmo motivo, em "terra", mesmo quando o substantivo designa o planeta, foi mantida a inicial minúscula.

Esta não pretende ser uma edição crítica. Nosso objetivo foi produzir uma edição fidedigna do texto machadiano que, através dos hiperlinks, oferece ao leitor do século XXI uma ferramenta de fácil utilização e encurta a distância entre ele, leitor, e o enorme universo de referências de Machado de Assis.

Registre-se aqui a colaboração, na pesquisa dos hiperlinks, de Camila Abreu, ex-bolsista de Iniciação Científica na Fundação Casa de Rui Barbosa; na revisão, a de Victor Heringer, bolsista de Iniciação Científica, e, na construção do texto digital e do software que possibilita a visualização dos links, a de Eduardo Pinheiro da Costa, técnico em informática da Fundação Casa de Rui Barbosa.

Marta de Senna, pesquisadora
Marcelo da Rocha Lima Diego, bolsista de Iniciação Científica
Fundação Casa de Rui Barbosa/CNPq/FAPERJ

dezembro de 2008

Revisto em fevereiro de 2011.

XXI

Poucos instantes esperou Estácio. Veio um homem abrir-lhe a porta; era o mesmo que ele vira ali uma vez. Entre ambos houve meio minuto de silêncio, durante o qual nem Estácio se lembrou de dizer o que queria, nem o desconhecido de lhe perguntar quem era. Olhavam um para o outro.

- Que desejava? - disse enfim o dono da casa.

- Um favor - respondeu Estácio, mostrando-lhe a mão ferida -. Ia a cair há pouco; procurando amparar-me, numa cerca de espinhos, feri-me, como vê. Podia dar-me um pouco d'água para lavar este sangue e...

- Pois não - interrompeu o outro -. Queira sentar-se aí no banco, ou se prefere, entrar... É melhor entrar - concluiu, abrindo-lhe caminho.

Em qualquer outra ocasião, Estácio teria recusado o convite, porque o espetáculo da pobreza lhe repugnava aos olhos saturados de abastança. Agora, ardia por haver a chave do enigma. Entrou. O desconhecido abriu uma das janelas para dar mais alguma luz, ofereceu ao hóspede a melhor cadeira e foi por um instante ao interior.

Estácio pôde então examinar, à pressa, a sala em que se achava. Era pequena e escura. A parede, pintada a cola já de longa data, tinha em si todos os sinais do tempo; primitivamente de uma só cor, a pintura apresentava agora uma variedade triste e desagradável. Aqui o bolor, ali uma greta, acolá o rasgão produzido por um móvel; cada acidente do tempo ou do uso dava àquelas quatro paredes o aspecto de um asilo da desgraça. A mobília era pouca, velha, mesquinha e desigual. Cinco ou seis cadeiras, nem todas sãs, uma mesa redonda, uma cômoda e uma marquesa, um aparador com duas mangas de vidro cobrindo castiçais de latão, sobre a mesa um vaso de louça com flores, e na parede dous pequenos quadros cobertos de escumilha encardida; tais eram as alfaias da sala. Só as flores davam ali um ar de vida. Eram frescas, colhidas de pouco. Atentando nelas, Estácio estremeceu: pareceu-lhe reconhecer uma acácia plantada em sua chácara. Quando a suspeita germina na alma, o menor incidente assume um aspecto decisivo. Estácio sentiu um calafrio.

Voltou o dono da casa, trazendo nas mãos uma bacia, e nos braços uma toalha, cuja alvura contrastava singularmente com a cor da parede e o aspecto senil da casa. Estácio ergueu-se.

- Deixe-se estar - disse o desconhecido.

- Estou perfeitamente bem.

- Nesse caso, faça o favor de chegar à janela.

A bacia foi posta na janela; o desconhecido quis lavar ele próprio a mão do hóspede; o moço não lho consentiu.

- Ao menos - disse o dono da casa - há de consentir que a enxugue. Eu entendo um pouco disto; infelizmente, não tenho aqui nenhum medicamento caseiro para aplicar.

Estácio aceitou o oferecimento. O dono da casa abriu a toalha e começou cuidadosamente a operação. O sobrinho de D. Úrsula pôde então examiná-lo à vontade.

Era um homem de trinta e seis a trinta e oito anos, forte de membros, alto e bem proporcionado. Uma cabeleira espessa e comprida, de um castanho escuro, descia-lhe da cabeça até quase tocar nos ombros. Os olhos eram grandes, e geralmente quietos, mas riam, quando sorriam os lábios, animando-se então de um brilho intenso, ainda que passageiro. Havia naquela cabeça - salvo as suíças - certo ar de tenor italiano. O pescoço, cheio e forte, surgia dentre dous ombros largos, e, pela abertura da camisa, que um lenço atava frouxamente na raiz do colo, podia Estácio ver-lhe a alva cor e a rija musculatura. Vestia pobre, mas limpamente, um rodaque branco, calça de ganga e colete de brim pardo. O vestuário, disparatado e mesquinho, não diminuía a beleza máscula da pessoa; acusava somente a penúria de meios.

Quando acabou de lavar os arranhões de Estácio - eram pouco mais do que isso -, propôs-se a ir buscar um pedaço de pano. Estácio, com a outra mão e os dentes, rasgou o lenço que trazia, e o dono da casa completou o sumário curativo.

- Pronto! - disse ele -. Se tiver em casa algum medicamento apropriado, será conveniente aplicá-lo. Toda a cautela é pouca; convém evitar alguma inflamação.

- Obrigado - respondeu Estácio -. Realmente, vim dar-lhe uma maçada, sem grande necessidade, talvez...

- Por quê?

- Podia fazer isto mesmo quando chegasse a casa.

- Mora perto?

- Um pedaço abaixo.

- Foi conveniente curar já; nenhuma precaução é inútil em cousa nenhuma da vida.

- Máxima de prudência - observou Estácio, procurando sorrir.

- Que só aprende tarde quem a não traz na massa do sangue - replicou o outro, suspirando.

A não ser indiscreto ou falador, era difícil levar a conversa por diante. O favor estava feito, o assunto, esgotado. Restava agradecer, despedir-se e sair. Estácio, entretanto, tinha necessidade de mais tempo; queria arrancar àquele homem uma palavra menos indiferente à situação, ou conhecer-lhe, se fosse possível, o caráter e os costumes. Para isso havia, talvez, um meio; contrafazer-se, empregar maneiras estranhas às suas, apegar-se à ocasião por todas as bordas. Estácio determinou-se a isso, confiando o resto ao acaso. Voltou à cadeira e sentou-se.

- Consente que descanse um pouco? Estou fatigadíssimo.

- Não pelo que caçou - disse o desconhecido, rindo.

- Volto com as mãos abanando. Nunca fui bom caçador, e tenho, não obstante, a mania de atirar aos pássaros.

- Não é esse o defeito de muita outra gente, em mais elevada ordem de cousas? Eu fui vítima desse defeito mortal.

- Ah! - exclamou Estácio com certa entonação interrogativa.

O dono da casa sorriu levemente, mas não pareceu molestá-lo a curiosidade do hóspede; talvez mesmo não desejasse outra cousa.

- É verdade - disse ele -; devo a minha atual penúria ao erro de teimar em cousas estranhas à minha índole e aptidão, estranhas e totalmente opostas...

- Há de perdoar-me - interrompeu Estácio, com um ar de familiaridade indiscreta, que lhe não era habitual -; eu creio que um homem forte, moço e inteligente não tem o direito de cair na penúria.

- Sua observação - disse o dono da casa sorrindo - traz o sabor do chocolate que o senhor bebeu naturalmente esta manhã antes de sair para a caça. Presumo que é rico. Na abastança é impossível compreender as lutas da miséria, e a máxima de que todo o homem pode, com esforço, chegar ao mesmo brilhante resultado, há de sempre parecer uma grande verdade à pessoa que estiver trinchando um peru... Pois não é assim; há exceções. Nas cousas deste mundo não é tão livre o homem, como supõe, e uma cousa, a que uns chamam mau fado, outros, concurso de circunstâncias, e que nós batizamos com o genuíno nome brasileiro de caiporismo, impede a alguns ver o fruto de seus mais hercúleos esforços. Césare sua fortuna! Toda a sabedoria humana está contida nestas quatro palavras.

O desconhecido proferiu isto com o tom mais simples e natural do mundo, e uma facilidade de elocução que Estácio mal lhe podia supor. Era aquilo uma comédia ou a expressão da verdade? Estácio olhou fixamente para ele, como a querer penetrá-lo. Ao mesmo tempo, ouviu-se um rumor na parte da casa que ficava além da sala. Estácio voltou a cabeça com um gesto de desconfiança. A porta abriu-se e apareceu uma preta velha trazendo nas mãos uma bandeja. A criada estacou a meio caminho.

- Põe em cima da mesa - disse o dono da casa -. Todo o meu almoço - continuou ele, voltando-se para Estácio -; almoço parco e higiênico. Ousarei oferecer-lho?

Estácio fez um gesto negativo, e dispôs-se a sair.

- Já! Não é meu intento despedi-lo; almoçarei conversando. Vivo tão solitário que a presença de alguma pessoa é para mim um encanto.

Estácio aceitou sem dificuldade o convite; sentou-se defronte do homem, ao pé da mesa, e assistiu ao almoço, que não podia ser mais escasso: um pão, duas hóstias de queijo duro e uma chávena de café. O que mais valia era o contentamento do dono da casa e a franqueza com que ostentava aos olhos de um estranho a simplicidade de seus hábitos.

- Não é refeição de príncipe - dizia ele -, mas satisfaz todas as ambições de um estômago sem esperança. Aqui é a sala de visitas e a sala de jantar; a cozinha é contígua; além, ficam duas braças de quintal; para lá do quintal... o infinito da indiferença humana.

E depois de um silêncio:

- Não digo bem - emendou ele -; nem sempre acho indiferença. Meu trabalho não me dá mais do que escasso pão de cada dia; mas tenho algumas alegrias, no meio de minha perpétua quaresma; e essas recebo-as de mãos caridosas e puras.

Dizendo isto, o desconhecido esgotou a chávena, e reclinou-se sobre a cadeira, fitando em cheio a cara do hóspede. Estácio refletiu nas últimas palavras, e um raio de esperança veio rasgar-lhe a nuvem que lhe entenebrecia a fronte. Os dous homens pareciam interrogar-se. O filho do conselheiro sacou do bolso um charuto e ofereceu ao dono da casa.

- Obrigado - disse este.

- Não fuma?

- Já fumei; hoje economizo esse vício. Nem por isso faço mais lentamente a digestão.

- Mora só?

- Só.

- Não tem família?

- Nenhuma.

- Há de achar-me singularmente indiscreto...

- Não; suponho que a sua curiosidade tem uma causa honrosa e legítima.

- Acertou; o senhor inspira-me simpatia. E se eu conhecesse algumas dessas mãos puras, que lhe emendam as lacunas da sorte...

- Dar-me-ia, por intermédio delas, o seu óbolo?

- Se o não ofendesse...

- Não ofendia, mas eu recusava, se soubesse; e peço-lhe desde já que o não faça às escondidas...

Estácio fez um gesto de assentimento.

- Não é orgulho - continuou o dono da casa -; é um resto de pudor que a pobreza me não tirou ainda. Fiz-lhe agora um obséquio, um simples dever de vizinho... Pareceria que o senhor mo pagava com um benefício. O benefício seria menos espontâneo de sua parte e menos agradável para mim. Agradável não exprime, talvez, toda a minha ideia; mas o senhor facilmente compreenderá o que quero dizer.

- Entendeu-me mal; o meu óbolo não seria na espécie a que o senhor alude. Tenho amigos e alguma influência; poderia arranjar-lhe melhor posição...

O desconhecido refletiu um instante.

- Aceitaria? - perguntou Estácio.

- Estou pensando na maneira de recusar. Ouro é o que ouro vale. Eu vexar-me-ia eternamente de dever qualquer melhora da sorte ao cumprimento de um dever de caridade.

- Já me não admira a vida pobre que tem tido.

- Excessivo escrúpulo, talvez?...

- Escrúpulo desarrazoado.

- Antes demais que de menos.

- Nem de menos nem demais; mas só a porção justa.

- A porção varia, conforme as necessidades morais de cada um. Mas eu mesmo, que lhe estou a falar, nem sempre tive esta virtude intratável; e porventura alguma vez fraqueei...

A fronte do desconhecido tornou-se sombria; a voz morreu-lhe nos lábios, e os olhos caíram naquela atonia que exprime uma grande concentração de espírito. Era ocasião de interrogá-lo diretamente ou sair. Estácio preferiu o último alvitre.

- Não o quero demorar mais - disse o dono da casa, quando o mancebo proferiu as palavras de despedida -. Já é tarde e sua mãe talvez esteja ansiosa...

Estácio limitou-se a olhar para ele em cheio, dizendo:

- Se alguma vez resolver dar de mão a seus escrúpulos, mande procurar-me. Minha casa é conhecida em todo Andaraí pela casa do conselheiro Vale...

O desconhecido, em cujo rosto Estácio esperou ver um sinal qualquer de abalo ou surpresa, conservou-se impassível e risonho. Curvou-se em sinal de agradecimento; e como Estácio hesitasse em estender-lhe a mão, ele meteu as suas nas algibeiras.

- Talvez nos vejamos ainda - disse Estácio já fora da porta.

- Sim?

- Passeio algumas vezes por estes lados.

- Nem sempre estou em casa; mas, ainda estando, conservo fechadas as portas. Quando quiser descansar, bata; a casa é pobre, mas será amiga.

Estácio afastou-se rapidamente. Eram dez horas, e o sol aquecia; ele não deu pelo sol nem pelo tempo. Semelhante ao transviado florentino, achava-se no meio de uma selva escura, a igual distância da estrada reta - diritta via - e da fatal porta, onde temia ser despojado de todas as esperanças. Nada sabia, nada conjecturava; eram tudo novas dúvidas e oscilações. O homem com quem acabava de conversar parecia-lhe sincero; a pobreza era autêntica, sensível a nota de melancolia que, por vezes, lhe afrouxava a palavra. Mas onde cessava ali a realidade e começava a aparência? Vinha de tratar com um infeliz ou um hipócrita? Estácio rememorou todos os incidentes da manhã, e todas as palavras do desconhecido; eram outros tantos pontos de interrogação suspeitos e irrespondíveis. Repelia com horror a ideia do mal: custava-lhe a aceitar a ideia do bem; e a pior das angústias - a dúvida - continha-o todo e agitava-o em suas mãos felinas. O sol e a agitação alastravam-lhe a testa de pérolas de suor; ao ofego da marcha apressada juntava-se o da violenta comoção. Estácio não via os objetos que ia costeando, nem as pessoas que lhe passavam ao lado; ia cego e surdo, até que o choque da realidade o despertasse.

Chegou enfim a casa. Ao portão estava um escravo, a quem deu a espingarda. A demora causara alguma inquietação à família; logo que as duas senhoras souberam de seu regresso, correram a recebê-lo, ficando D. Úrsula a uma janela, e descendo Helena até meio caminho. A aparição súbita da moça, a alegria e o amor, que pareciam impeli-la, a perfeita ingenuidade do gesto, tudo produziu nele a necessária reação - reação de um instante, mas salutar, porque a crise era demasiado violenta. Estácio apertou as mãos da moça com energia. Um fluido sutil percorreu as fibras de Helena, e aquele rápido instante teve toda a doçura de uma reconciliação.

Estácio contava recolher-se ao quarto para pôr em ordem as ideias, compará-las, extrair uma conjectura, pelo menos, e verificá-la ou desmenti-la. Mas, nem a tia nem a irmã haviam almoçado, à espera dele, e forçoso lhe foi acompanhá-las na satisfação de uma necessidade que não sentia. Durante o almoço, Estácio procurou observar Helena - trabalho ocioso, porque o rosto da moça, se alguma cousa traía nessa ocasião, eram as alegrias inefáveis da família. Ela própria servia por suas mãos a Estácio e D. Úrsula; inexcedível na atenção com que sabia repartir-se entre os convivas, não o era menos no carinho, e na graça. Nos olhos parecia estampada a ignorância do mal, e o sorriso era o das almas cândidas. Poder-se-ia atribuir àquela criatura de dezessete anos corrupção e hipocrisia? Estácio envergonhou-se de tal ideia; sentiu as vertigens do remorso.

Mas o almoço acabou, dispersou-se a companhia, o mancebo recolheu-se ao gabinete, e, desfeita a visão, voltou a suspeita. Estácio buscou dominar a situação. Ele não ia ao ponto de supor em Helena a completa perversão dos sentimentos; o limite do mal que se lhe podia atribuir, era o de uma culposa leviandade. Se, em vez de um ato leviano, fosse aquilo um simples estratagema de caridade, Helena não mereceria menos uma advertência; mas a pureza da intenção salvava tudo, e a paz da família, não menos que o seu decoro, se restabeleceria inteira. Estácio examinou um por um todos os indícios de culpabilidade e de inocência; buscou sinceramente os elementos de prova; não esqueceu um só argumento de indução. Nesse trabalho despendeu longo tempo, sem resultado apreciável, pela razão de que, se a sentença era difícil de formular, o juiz era incompetente para decidir; entre a dignidade e a afeição balouçava incerto.

Quase à hora do jantar, Estácio, que não saíra uma só vez do gabinete, chegou a uma das janelas, e viu atravessar a chácara a mais humilde figura daquele enigma, humilde e importante ao mesmo tempo: o pajem. O pajem apareceu-lhe como uma ideia nova; até aquele instante não cogitara nele uma só vez. Era o confidente e o cúmplice. Ao vê-lo, recordou-se de que Helena lhe pedira uma vez a liberdade daquele escravo. A ameaça rugiu-lhe no coração; mas a cólera cedeu à angústia e ele sentiu na face alguma cousa semelhante a uma lágrima.

Nesse momento duas mãos lhe taparam os olhos.

XXII

Não era preciso grande esforço para adivinhar a dona das mãos. Estácio, com as suas, afastou as mãos de Helena, segurando-lhe os pulsos de modo que lhe arrancou um leve gemido. Voltando-se, deu com os olhos na irmã, que lhe disse em tom de gracioso reproche:

- Você é muito mau! Pagou-me a carícia com um apertão. Deixe estar que nunca mais cairei em outra. Vim vê-lo, porque você hoje não se lembrou ainda de dar à gente um ar de sua graça... Doeu-me! - continuou ela olhando para os pulsos -. Mas... tenho os dedos molhados; seria... você estaria... que é? Que foi?

Estácio, que ouviu o discurso da irmã com o rosto desfeito e o olhar ansioso, não lhe respondeu às últimas interrogações, e continuou a olhar para ela, como a querer ler na fisionomia da moça a explicação do enigma que o atordoava. Helena ainda insistiu, aterrada e aflita. Indo pegar-lhe nas mãos, Estácio desviou o corpo, dirigiu-se à parede, despendurou o desenho que Helena lhe dera no dia de seus anos, e aproximou-se da moça.

- Que é? - repetiu esta admirada.

A única resposta de Estácio foi estender o dedo sobre a misteriosa casa reproduzida na paisagem. Helena olhou alternadamente para o desenho e para o irmão. A expressão interrogativa e imperiosa deste fê-la atenta no ponto indicado. Súbito empalideceu; os lábios tremeram-lhe como a murmurar alguma cousa, mas a alma falou tão baixo que a palavra não chegou à boca. Durou aquilo poucos instantes. A angústia lia-se no rosto dos dous; a moça, para ocultar a sua, cobriu os olhos com as mãos. O gesto era eloquente; Estácio lançou para longe de si o quadro, com um movimento de cólera. Helena atirou-se para o corredor.

Dona Úrsula aguardava os sobrinhos para jantar. Demorando-se estes, dirigiu-se ela própria ao gabinete de Estácio. A porta estava aberta; D. Úrsula entrou e deu com ele, sentado numa poltrona, com o lenço na cara como a soluçar. A tia correu com a velocidade que lhe permitiam os anos. Estácio não a ouviu entrar; só deu por ela quando as mãos da boa senhora lhe arrancaram as suas dos olhos. O assombro de D. Úrsula foi indescritível, sobretudo quando Estácio, erguendo-se, atirou-se-lhe aos braços, exclamando:

- Que fatalidade!

- Mas... que é?... Explica-te.

Estácio enxugou as faces molhadas do longo e silencioso pranto, com o gesto decidido de um homem que se envergonha de um ato de debilidade. A explosão desabafara-lhe o espírito; podia enfim ser homem, e era preciso que o fosse. Dona Úrsula pediu e ordenou que lhe confiasse a causa da inexplicável aflição em que viera achá-lo. Estácio recusou dizê-la.

- Saberá tudo amanhã ou logo. Agora só poderia dar-lhe um enigma, e eu sei o que ele me há custado. Algumas horas mais, e precisarei de seu conselho e apoio.

Dona Úrsula resignou-se à demora. Quando chegou à sala de jantar achou um recado de Helena; mandava-lhe dizer que se sentira repentinamente incomodada e que a dispensasse naquela tarde e noite. Dona Úrsula suspeitou logo que o recado de Helena tivesse relação com a aflição de Estácio, e correu ao quarto da sobrinha. Achou-a meio inclinada sobre a cama, com o rosto na almofada, e o corpo tranquilo e como morto. Ao sentir os passos de D. Úrsula, ergueu a cabeça. A palidez era grande, e profundo, o abatimento; mas não houvera lágrimas. A dor, se a houve, e houve, parecia ter-se petrificado. O que restava ainda vivo na figura da moça eram os olhos, que não perderam o fulgor natural. Ela ergueu-os a medo, e abraçou a tia com um olhar de súplica e de amor. Dona Úrsula travou-lhe das mãos, encarou-a silenciosamente, e murmurou:

- Conta-me tudo.

- Saberá depois! - suspirou a moça.

- Não tens confiança em tua tia?

Helena ergueu-se e lançou-se-lhe nos braços; duas lágrimas rebentaram-lhe dos olhos, e foram as primeiras que eles verteram naquela meia hora. Depois beijou-lhe as mãos com ternura:

- Pode receber estes beijos - disse ela -, os anjos não os têm mais puros.

Foram as últimas palavras que D. Úrsula pode arrancar-lhe; a moça recolheu-se ao silêncio em que ela a encontrou. Dona Úrsula saiu; e foi dali ter com Estácio. O sobrinho encaminhava-se para a sala de jantar.

- Vamos para a mesa - disse ele -, não convém que os escravos saibam de tais crises...

Dona Úrsula referiu o estado em que achara Helena e as palavras que trocara com ela. Estácio ouviu-a sem nenhuma expressão de simpatia. O jantar foi um simulacro; era um meio de iludir a perspicácia dos escravos, que aliás não caíam naquele embuste. Eles conheceram perfeitamente que algum acontecimento oculto trazia suspensos e concentrados os espíritos. As iguarias voltavam quase intactas; as palavras eram trocadas com esforço entre a sinhá velha e o senhor moço. A causa daquilo era, com certeza, nhanhã Helena.

Estácio deu ordem para que a todas as pessoas estranhas se declarasse estar ausente a família. A única exceção era o padre Melchior. A esse escreveu pedindo-lhe que os fosse ver.

- Não posso esperar até amanhã - disse D. Úrsula -; se tens de revelar alguma cousa a um estranho, por que o não fazes a mim primeiro? Dize-me o que há. Não posso ver padecer Helena; quero consolá-la e animá-la.

- O que tenho para dizer é longo e triste - retorquiu Estácio -; mas, se deseja sabê-lo desde já, peço-lhe ao menos que espere a presença do padre Melchior. Eu não poderia dizer duas vezes as mesmas cousas, seria revolver o punhal na ferida.

A curiosidade de D. Úrsula cresceu com estas meias palavras do sobrinho; mas era forçoso esperar, e esperou. Foi dali ao quarto de Helena. Como a porta estivesse fechada, espreitou pela fechadura. Helena escrevia. Esta nova circunstância veio complicar as impressões de D. Úrsula.

- Helena está encerrada no quarto, e escreve - disse ela ao sobrinho.

- Naturalmente - respondeu este, com sequidão.

O padre Melchior não se demorou em acudir ao chamado de Estácio. O bilhete era instante e a letra, febril. Algum acontecimento grave devia ter-se dado. A reflexão do padre era justa, como sabemos; ele o reconheceu desde logo, não só no aspecto lúgubre da família, como na ânsia com que era esperado. Os três recolheram-se a uma das salas interiores.

- Helena? - perguntou Melchior.

- Vamos tratar dela - respondeu Estácio.

Referir o que se passara naquela fatal manhã era mais fácil de planear que de executar. No momento de expor a situação e as circunstâncias dela, Estácio sentiu que a língua rebelde não obedecia à intenção. Achava-se num tribunal doméstico, e o que até então fora conflito interior entre a afeição e a dignidade, cumpria agora reduzi-lo às proporções de um libelo claro, seco e decidido. Inocente ou culpada, Helena aparecia-lhe naquele momento como uma recordação das horas felizes - doce recordação que os sucessos presentes ou futuros podiam somente tornar mais saudosa, mas não destruiriam nunca, porque é esse o misterioso privilégio do passado. Reagiu, entretanto, sobre si mesmo; e, ainda que a custo, referiu minuciosa e sinceramente o que se passara desde aquela manhã.

Não fora talhado para tão melindrosas revelações o coração de D. Úrsula. Desde o princípio da conversação sentiu o atordoamento que dão os grandes golpes. Esperava, decerto, um grande infortúnio de Helena, um episódio da família anterior, alguma cousa que desafiasse a compaixão, sem diminuir o sentimento da estima. Acontecia justamente o contrário; a estima era impossível e a compaixão tornava-se apenas provável.

- Mas não! É impossível! - exclamou ela daí a pouco, logo que a razão, obscurecida pelo abalo, pôde readquirir alguma luz -... Não! Eu a vi há pouco; senti-lhe as lágrimas na minha face, ouvi-lhe palavras que só a inocência pode proferir. E, além disso, seu procedimento irrepreensível, um ano quase de convivência sem mácula, a elevação de seus sentimentos... não posso crer que tudo isso... Não! Pobre Helena! Vamos chamá-la, ela explicará tudo. Interroguemos o Vicente.

Um gesto dos dous homens mostrou que nenhum deles julgava digno este último recurso para conhecer a verdade.

Dona Úrsula caíra em prostração, recordava suas apreensões do primeiro dia, e recuava com horror à ideia de ter acertado. Defronte dela, Estácio ocupava uma poltrona rasa, em cujos braços fincava os cotovelos, apoiando nas mãos a cabeça ardente e abatida. A alma ruminava a dor.

Um só dos três vingava a dignidade da situação. O padre Melchior não sentira menor assombro que os dous parentes de Helena, nem padeceu menos profundo golpe; mas reergueu-se de um e outro; pôde vencer-se e conservar a razão clara, fria e penetrante. Entre os dous corações ulcerados e sem força, compreendeu Melchior que lhe cabia a principal ação, e não recuou ante a responsabilidade que daí poderia deduzir. Viu de um lance a extensão possível do mal, a desunião da família, os desesperos da ocasião, os ódios do dia seguinte, as amarguras indeléveis, e, talvez, as indeléveis saudades; mas nem este quadro o aterrou, nem ele o aceitou sem exame. Melchior não condenava nem absolvia; esperava. Ele pertencia ao número dessas virtudes singelas para as quais o vício é uma rara exceção; natureza sincera e franca, era-lhe difícil crer na hipocrisia. Enquanto Estácio prosseguia calado e pensativo, e D. Úrsula, ora sentada, ora de pé, intercalava o silêncio com exclamações de dor, Melchior observava-os e refletia também consigo. Enfim, proferiu estas palavras de animação:

- Sossegue, D. Úrsula; a verdade há de aparecer, e não estamos certos de que seja o que nos parece. Em todo o caso, não antecipemos a aflição. Seria padecer duas vezes. Há tempo de chorar à larga.

Melchior levantou-se:

- Convém sacudir o abatimento - continuou, dirigindo-se a Estácio -; é a hora da ação e do vigor. Sobretudo, é necessário não boquejar de semelhante assunto por agora; daria azo às vozes estranhas e seus naturais comentários. Eu tomarei nesta colisão o lugar que me compete, se mo não contestam...

- Oh! - exclamou Estácio.

- ... Mas, desejo que desde já se compenetrem bem de que, se a dignidade pede uma cousa, a caridade pede outra, e que o dever estrito é conciliá-las. Nada de ódios; perdão ou esquecimento.

- Mas, padre-mestre, que lhe parece? - perguntou D. Úrsula com ansiedade.

- Dona Úrsula - disse o padre -, é preciso agora que a razão fale e trabalhe; o sentimento deve retrair-se e esperar. Examinarei o caso e aconselharei o necessário remédio. Talvez estejamos a debater-nos no vácuo; quem sabe? Trata-se de um equívoco, de uma aparência...

- Oh! Ela confessou tudo! - interrompeu Estácio -. Vi-lhe a expressão da culpa nos olhos. Mas, enfim, estou pronto para tudo - continuou ele erguendo-se -. Não foi o senhor um dos melhores amigos de meu pai? Não o é ainda nosso? Ajude-nos, aconselhe-nos; faremos o que lhe parecer melhor. Na situação em que nos achamos, nenhum de nós tem o espírito bastante senhor de si para colher os elementos da verdade, apurá-la e resolver. Esse papel é seu.

Vieram trazer a Estácio uma carta. Era do Dr. Camargo, anunciando-lhe que a madrinha de Eugênia falecera, e que ele no prazo de alguns dias estaria na Corte. Era o pior momento para semelhante vinda; Estácio não pôde reprimir um gesto de desgosto. O padre, dizendo-lhe o mancebo de que tratava a carta, observou que nenhum inconveniente podia haver no regresso de Camargo, uma vez que, sem demora, ficasse liquidado o assunto que os afligia.

- Dona Úrsula - continuou ele -, deixe-nos agora sós alguns instantes: vá tranquila, confie em Deus, e não faça suspeitar a ninguém o que se passa nesta casa.

Dona Úrsula obedeceu. Logo que ela saiu, Melchior fechou a porta. Estácio sentou-se de novo, disposto a ouvir o capelão. Este deu alguns passos entre a porta e uma das janelas. Ia anoitecendo; Estácio acendeu um candelabro. Melchior sentou-se ao pé dele, sem lhe falar nem lhe voltar sequer os olhos. Meditava ou lutava consigo mesmo; a fronte pesada e merencória traduzia a agitação interior. Já não era a inalterável placidez, reflexo de uma consciência religiosa e pura. Se a consciência era a mesma, não o era o coração, a braços com uma crise nova. Após dez minutos de profundo silêncio entre ambos, o padre falou.

A+
A-