Helena
NOTA DESTA EDIÇÃO ELETRÔNICA
Helena, terceiro romance publicado por Machado de Assis, saiu pela primeira vez em livro em 1876. Em 1905, veio à luz a segunda edição, ainda em vida do autor, o que, em princípio, a tornaria o texto a partir do qual se deveria fazer a preparação de edições fidedignas do romance.
No entanto, por causa de uma gralha na impressão da primeira edição, logo na primeira frase do primeiro capítulo, a segunda edição consagrou, para as futuras, a data de abril de 1859 para a morte do conselheiro Vale, acontecimento que desencadeia toda a trama do romance. Na verdade, o ano só pode ser 1850, tal como está na primeira edição, embora o quadrante esquerdo inferior do algarismo zero, nessa edição, esteja mal impresso, quase apagado, e daí seja possível deduzir a origem do erro que se perpetuou em quase todas as edições seguintes. A data que Helena põe no desenho que oferece a Estácio no capítulo XI, julho de 1850, o comprova, indicando também que toda a ação se desenrola nesse ano.
O relato desse equívoco serve, quanto mais não seja, para indicar que, no trabalho de estabelecimento de textos literários, não pode haver regras fixas e que o melhor será sempre compulsar mais de uma edição. Assim, o procedimento aqui adotado foi tomar como fonte a primeira edição e, sempre que foram encontradas discrepâncias, consultar também a segunda (1905), a da Comissão Machado de Assis, de 1975, e a preparada por José Galante de Sousa e supervisionada por Adriano da Gama Kury, publicada em coedição pela Garnier (Belo Horizonte) e pelas Edições Casa de Rui Barbosa (Rio de Janeiro), em 1988.
A narrativa de Helena é de terceira pessoa onisciente, mas, como ocorre em outros romances de Machado, aqui e ali o narrador aflora no texto por meio de um pronome pessoal de primeira pessoa ou de um verbo flexionado, como em: "Eugênia desfiou uma historiazinha de toucador, que omito em suas particularidades por não interessar ao nosso caso [...]" (cap. V; itálicos nossos). Tal procedimento conduz, quase naturalmente, ao que se convencionou chamar de autoconsciência narrativa, ou seja, intromissões do narrador no próprio relato, alertando o leitor para este ou aquele fato, chamando sua atenção para este ou aquele desdobramento da história, para este ou aquele procedimento técnico. É o que ocorre, por exemplo, em: "Estácio referiu à tia a cena do capítulo anterior e as palavras que lhe dissera Helena" (cap. VII, itálicos nossos); ou em: "[Helena] ali sentou-se num sofá, e derreou levemente o corpo, deixando cair os cílios, não sei se pensativos, se pesados de sono (cap. XII; itálicos nossos). Esse procedimento, comum nos contos e romances de Machado de Assis (Quincas Borba é pródigo em exemplos) pode servir, paradoxalmente, a dois propósitos opostos: por um lado, chama a atenção para o livro como artefato, como algo que não é a realidade, levando o leitor a refletir que não está diante de uma janela aberta para o real e, sim, de uma obra de arte construída por um escritor; por outro, reforça a verossimilhança, quando o narrador finge não saber o que se esconde por trás das atitudes das personagens, como acontece na vida real, em que nunca podemos ter certeza do que pensam ou sentem as pessoas com quem convivemos.
A grande especificidade de Helena é, seguramente, o fato de o enredo ter no romance uma importância talvez inigualada no conjunto da obra machadiana, prendendo o leitor até o desenlace da trama, na qual se misturam uma boa dose de romantismo e uma espécie de desmentido dos determinismos naturalistas.
Na preparação deste texto, foram tomadas algumas decisões editoriais, das quais é preciso dar conta ao leitor. Períodos da história do Brasil ("Primeiro Reinado") bem como instituições ("Câmara dos Deputados") tiveram seus nomes escritos com inicial maiúscula. Pronomes de tratamento foram abreviados e grafados com maiúscula inicial ("Sr.", "Dr.", "D."), exceto quando em início de frase. Procuramos respeitar certas peculiaridades da linguagem machadiana como, por exemplo, o uso de "até ao" ou "até à", hoje em desuso no português do Brasil, mas comum em Portugal ainda no século XXI ("Helena estava de pé, no mesmo lugar, e percorria rapidamente as linhas, até ao final da última página".); ou o emprego do modo indicativo depois de "talvez" ("Talvez hesitava falar; talvez buscava o melhor meio de dizer o que tinha no coração."); ou o uso da grafia antiga de algumas palavras, desde que ainda consignadas nos principais dicionários brasileiros ("céptico", "gérmen"); ou, ainda, a utilização do pronome pessoal oblíquo "lhe" como sujeito do infinitivo, quando o uso gramaticalmente preconizado é o de "o" ("mas a segurança da moça logo lhe deixou ver [...]").
Como sempre, uma das maiores dificuldades é a pontuação. Ao preparar esta edição, optamos por uma política a meio caminho entre uma atualização radical, de acordo com as normas presentemente vigentes, e o respeito à pontuação de Machado de Assis, que, de resto, é comum aos escritores de língua portuguesa no século XIX. Para citar dois exemplos: mantivemos todas as vírgulas antes da aditiva "e" precedendo verbos cujo sujeito era precisamente o mesmo da oração anterior ("Helena ouvia com um sorriso, e respondia com um gracejo; [...]"); bem como as vírgulas em cujo uso percebemos um gesto estilístico ("O filho do conselheiro atravessou sozinho a chácara; ia pensativo, e aborrecido."). Diante da inconsistência no emprego / não emprego de vírgula depois de locuções adverbiais, às vezes dentro de um mesmo período, optamos por deixar como está nas edições consultadas ("De longe, via-a através da névoa luminosa da imaginação; ao pé era difícil que Eugênia conservasse os dotes que ele lhe emprestava."). Por outro lado, nos casos em que consideramos que a vírgula (ou a ausência dela) comprometia o melhor entendimento do texto, não hesitamos em intervir, como ocorreu no caso de vírgulas precedendo orações adjetivas restritivas (que suprimimos) e de falta de vírgulas precedendo orações adjetivas explicativas (que inserimos). Pelo mesmo motivo, assinalamos as elipses verbais com vírgula ("Tinha as feições duras e frias, os olhos, perscrutadores e sagazes, [...]").
Optamos por recorrer às aspas sempre que a "fala" de uma personagem é, na verdade, a expressão verbal de um pensamento que não chega a ser exteriorizado. Nos diálogos, foi preservado o travessão. Os numerais foram grafados por extenso, que é o uso predominante na prosa do autor. Adotou-se esse procedimento pelo mesmo motivo que se mantiveram em língua estrangeira os vocábulos assim escritos na primeira edição, por acreditar-se que tudo isso contribui para aquilo que se poderia chamar de "atmosfera textual" machadiana. Pelo mesmo motivo, em "terra", mesmo quando o substantivo designa o planeta, foi mantida a inicial minúscula.
Esta não pretende ser uma edição crítica. Nosso objetivo foi produzir uma edição fidedigna do texto machadiano que, através dos hiperlinks, oferece ao leitor do século XXI uma ferramenta de fácil utilização e encurta a distância entre ele, leitor, e o enorme universo de referências de Machado de Assis.
Registre-se aqui a colaboração, na pesquisa dos hiperlinks, de Camila Abreu, ex-bolsista de Iniciação Científica na Fundação Casa de Rui Barbosa; na revisão, a de Victor Heringer, bolsista de Iniciação Científica, e, na construção do texto digital e do software que possibilita a visualização dos links, a de Eduardo Pinheiro da Costa, técnico em informática da Fundação Casa de Rui Barbosa.
XV
Estácio levantou-se ao amanhecer. Uma vez pronto, quis surpreender a tia e a irmã com uma lembrança sua, e escreveu numa folha de papel estas simples palavras: "Até à volta; seis horas da manhã." Dobrou-a e foi pô-la sobre a mesa de costura de D. Úrsula. Dali passou à sala de jantar, depois à varanda. Aqui chegando, deu com os olhos em Helena, que o esperava ao pé da escada.
- Silêncio! - disse graciosamente a moça -. Não faça espantos, que pode acordar titia. Vim saber se você precisa de alguma cousa.
- De nada - respondeu Estácio comovido -. Mas que imprudência foi essa de se levantar tão cedo?
- Cedo! O sol não tarda a cumprimentar-nos. Adeus! Muitas recomendações a Eugênia. Não lhe falta nada, não é assim?
- Nada.
Estácio recebeu a mão que Helena lhe estendera e ficou a olhar para ela.
- Olhe que é tarde!
Dizendo isto, Helena apertou-lhe a mão e procurou retirar a sua; Estácio reteve-a.
- Se soubesses como me custa ir!
- São apenas alguns dias...
- Valem por meses, Helena! Adeus, não te esqueças de mim. Escreve-me; eu escreverei logo que chegar. Não faças imprudências, não saias a passeio enquanto eu estiver ausente.
- Adeus!
- Adeus!
Estácio quis dar-lhe o abraço da despedida; mas a moça, menos ainda com a palavra que com o gesto, fê-lo recuar.
- Não - disse ela afastando-se -; as despedidas mais longas são as mais difíceis de suportar.
Recuou até à porta da sala de jantar, fez um gesto de despedida e entrou. Estácio desceu a custo as escadas. Helena viu-o descer e sair; depois subiu cautelosamente ao seu aposento. Ali sentou-se alguns minutos, pensativa e triste. Ergueu-se enfim, vestiu rapidamente as roupas de montar; colocou o chapelinho preto sobre os cabelos penteados à ligeira, e desceu. Na chácara esperava-a Vicente, com a égua ajaezada e pronta. Helena montou sem demora; o pajem cavalgou uma das duas mulas que havia na cavalariça e os dous saíram a trote na direção da casa do alpendre e da bandeira azul.
A casa estava ainda silenciosa; porta e janelas conservavam-se hermeticamente fechadas. Helena apeou-se e bateu de mansinho; repetiu as pancadas progressivamente mais fortes. Ninguém lhe respondeu. Helena impaciente rodeou a casa; mas parece que achou igualmente fechadas as portas do fundo, porque volveu logo. Colou o ouvido à porta e esperou. Quando lhe pareceu que era baldado o esforço, tirou da algibeira um lápis e um pedacinho de papel; colocou o pé no degrau de tijolo e sobre o joelho escreveu algumas palavras; dobrou depois o papel e introduziu-o por baixo da porta. Esperou ainda alguns minutos, caminhou para a égua, montou e regressou a casa.
Vinha triste e pensativa. A égua, a passo vagaroso, não sentia o esforço da cavaleira, que a deixava ir, frouxa a rédea, inútil o chicote. O pajem levava os olhos na moça com um ar de adoração visível; mas, ao mesmo tempo, com a liberdade que dá a confiança e a cumplicidade, fumava um grosso charuto havanês, tirado às caixas do senhor.
Dona Úrsula não estava ainda levantada; Helena não lhe ocultou o passeio. O dia correu triste e solitário, como os seguintes, sem embargo da companhia que iam fazer às duas senhoras as pessoas mais íntimas. Mendonça, a quem Estácio as recomendara, era ali pontual; conseguia disfarçar um pouco as saudades do moço ausente. O padre Melchior prolongava visitas quotidianas. O mesmo sentimento ligava a todas as pessoas.
O mesmo era, e não único, porque outro e mais egoísta e pessoal veio ali viçar também. Mendonça sentiu que metade de seu destino estava acabada, e que a outra metade ia começar, mais circunspecta que a primeira. O relógio em que ele viu bater essa hora fatídica foram os olhos de Helena. Mendonça começava a amar. Estouvado, e não corrupto, atravessara o delírio dos primeiros anos sem perder a flor dos castos afetos, sem sequer a haver colhido. Helena sentiu nascer e crescer essa adoração silenciosa, sem parecer que a descobrira. Não animou o mancebo nem o repeliu; redobrou de confiança - dessa confiança que só se dá aos simples familiares, e que mostra claramente a um namorado a inanidade de suas esperanças. Ao parecer de estranhos, a situação afigurava-se de perfeita concórdia. O coronel-major piscou um dia os olhos ao Dr. Matos; o Dr. Matos proferiu um - latet anguis in herba - e ambos foram repartir o pão das conjecturas com a esposa do advogado, senhora muito perspicaz nos namoros de salão. A opinião dos três é que o casamento era cousa provável, e talvez certa. Um só obstáculo podia haver; eram os escrúpulos do pai de Mendonça. Esse mesmo obstáculo não existia, porquanto, além das qualidades estimáveis da moça, havia o reconhecimento legal e social, público e doméstico; acrescendo (observação do Dr. Matos) que duzentas e tantas apólices mereciam um cumprimento de chapéu e não davam lugar a cinco minutos de reflexão.
As primeiras cartas de Estácio chegaram uma tarde em que as duas senhoras e Mendonça se achavam na varanda, acabado o jantar, bebendo as últimas gotas de café. Dona Úrsula, depois de pôr em atividade três mucamas para lhe irem procurar os óculos, levantou-se e foi ela própria à cata deles, com a sua carta na mão. Helena ficou com a que lhe era dirigida; estava sentada junto a uma das janelas, abriu-a e leu-a para si:
Quando esta carta te chegar às mãos, estarei morto, morto de saudades de minha tia e de ti. Nasci para os meus, para a minha casa, os meus livros, os meus hábitos de todos os dias. Nunca o senti tanto como agora que estou longe do que há mais caro neste mundo. Poucos dias lá vão, e já me parecem meses. Que seria se a separação não fosse tão limitada?
Na carta que escrevo a titia dou conta da nossa viagem e da saúde de todos. Dona Clara está, na verdade, à beira da morte; mas pode durar ainda alguns dias, e o Dr. Camargo resolveu esperar até dar-lhe os últimos adeuses. A recepção que nos fez a família foi cordialíssima. Há aqui uma cunhada da enferma, um primo, três sobrinhos, outros parentes e vários afilhados. O primo é comendador e tenente-coronel; ele e os outros são a gente mais afável do mundo. Os homens da família são influências eleitorais; quando souberam da minha candidatura, ofereceram-me logo os seus serviços, com a cláusula única de que haja prévia recomendação do Rio de Janeiro. Agradeci o favor, com muita abundância d'alma, porque a tal candidatura, que não me seduzia nem seduz, não há remédio senão cuidar dela, de modo que o meu nome não padeça a injúria da derrota. Que te parece esta pontazinha de vaidade?
Mudemos de assunto, que este me aflige, e não quero filosofar sem ti, que és a minha companheira nestas vadiações de espírito. Aí não te lembrarás, talvez, das nossas palestras; aqui lembra-me tudo. De manhã, dou o meu passeio equestre, como lá; mas que diferença! Quem vai a meu lado é o tenente-coronel, excelente homem, coração de pomba, com o defeito único e enorme de se não chamar D. Helena do Vale, a minha boa Helena, que lá está na Corte, a divertir-se sem seu irmão. Ele fala de tudo e muito: do café, do governo, das eleições, dos escravos, dos impostos. Eu ouço, que é o menos que posso fazer, e deixo-o ir sem interrupção. Às vezes, como que desconfiado, recolhe-se ao silêncio; eu ato o fio da conversa e ele encarrega-se de desenrolar o novelo. Tão pouca cousa o faz feliz! Já cacei uma vez; confesso-te que é o que me pode distrair um pouco. Pensava ter perdido o costume; mas não perdi. A modéstia impede-me dizer mais.
A fazenda é vasta e a casa excelente. Não te direi que gosto da vida agrícola; não gosto, não me dou com ela. Mas viver num recanto como este, a dous passos do mato, a tantas léguas da rua do Ouvidor, isso creio que se dá com a minha índole. Consultaremos titia. Eu não sei o que é amar o tumulto exterior; acho que é dispersar a alma e crestar a flor dos sentimentos. Nasci para monge... e creio que também para déspota, porque estou a planear uma vida ignorada e deserta, sem consultar tuas preferências. Sou um Cromwell com tendências de frade; ou, por dizer tudo numa só palavra: sou um Lutero... muito inferior.
Pobre Helena! Já lá vão quatro páginas só a falar de mim. Vejamos o que tens feito. Andas muito triste? Passeias? Lês? Jogas? Tocas? Conta-me a tua vida o mais miudamente que puderes. Conta-me a vida de todos. Não me escondas nada; se, por exemplo, ao abrir um livro ou tocar uma tecla do piano, pensares em mim, escreve isso mesmo, marcando o dia e até a hora, se puder ser. E depois dou-te o direito de perguntar onde ficou a minha gravidade, e responderei que há uma puerilidade séria, e que os extremos se tocam. Quando assim não seja, a culpa é do céu, que me não deu uma irmã criança; agora é preciso que comecemos pela primeira fase da vida.
Deixei muito recomendado ao Mendonça que fosse à nossa casa com frequência. Não sei se ele se terá lembrado e cumprido a promessa que me fez. Se não tiver cumprido, hás de mandar-lhe dizer que eu o detesto e abomino; que ele é o maior traidor que o céu cobre; que tudo fica acabado entre mim e ele; que a amizade é um culto, etc. Dize o que te parecer e pelo modo que te é usual.
Lembro-me de ti a propósito de tudo. Hoje de tarde, por exemplo, o terreiro oferecia um aspecto bonito e característico. "Se ela estivesse aqui", disse comigo, "faria um magnífico desenho". Peguei de um lápis que trouxe, meia folha de papel, e quis reproduzir o panorama. Escrevi um problema algébrico! Foi um conselho que me deu o lápis: ninguém se meta a fazer aquilo que ignora. Eu ignorava o que era estar ausente da família; por que motivo me determinei a tentá-lo? Interrompi esta carta para receber o Dr. Fróis, que é o médico de D. Clara; veio ao meu quarto para me dizer que o estado da doente é perdido, que a morte é certa; mas que a vida pode prolongar-se ainda por muitos dias. Vê que perspectiva! Estou com raiva de mim mesmo; esses últimos dias da enferma pesam sobre mim como se fora o punho fechado do destino. Se a morte é certa, por que viver alguns dias mais? E é vida isso, ou é morrer aos goles, sem consciência do que se perde nem do que se vai ganhar? Está decidido; posso ir daqui a seis dias ou daqui a um mês. Será o que Deus quiser. Manda-me, entretanto, alguns livros. No meu quarto só achei um Manual de medicina prática. Manda-me alguma cousa que me faça lembrar o Andaraí. Tira da estante oito ou dez volumes, à tua escolha. Manda também algum trabalho de agulha teu; quero mostrá-lo à cunhada de D. Clara, a quem gabei muito os teus talentos. Se puderes desenhar alguma cousa, à pressa, o tanque, a varanda ou qualquer outro lugar, faze-o, e manda com o resto. Escreve-me longamente; conta-me tudo o que houver interessante; fala-me de ti, que é o meio de consolar minhas saudades, que são imensas, imensas como este amor que tenho à minha família toda. Vou fazer por voltar breve. Adeus, minha boa Helena; adeus, minha vida, adeus, ó mais bela e doce de todas as irmãs!
P.S. Reli a carta, e fiquei envergonhado do trecho a respeito da vida da doente. Perdoa-me a ferocidade, e leva-a em conta da solidão.
XVI
Helena leu e releu a carta. Depois ficou silenciosa, a olhar para as folhas da trepadeira, que do lado de fora viera a subir pela muralha da varanda e a debruçar-se enfim do parapeito para dentro. A carta ficara aberta sobre os joelhos da moça. Mendonça, a poucos passos, olhava para esta, sem ousar falar-lhe.
Goethe escreveu um dia que a linha vertical é a lei da inteligência humana. Pode dizer-se, do mesmo modo, que a linha curva é a lei da graça feminil. Mendonça o sentiu, contemplando o busto de Helena e a casta ondulação da espádua e do seio, cobertos pela cassa fina do vestido. A moça estava um pouco inclinada. Do lugar em que ficava, Mendonça via-lhe o perfil correto e pensativo, a curva mole do braço, e a ponta indiscreta e curiosa do sapatinho raso que ela trazia. A atitude convinha à beleza melancólica de Helena. O rapaz olhava para ela sem movimento nem voz.
A tarde expirava; a cor verde do morro fronteiro ia tomando o aspecto cinzento-escuro que precede a cor fechada da noite. A própria noite desceu, e um escravo entrou na varanda a acender as duas lâmpadas que pendiam do teto. Esta circunstância acordou a moça, e bastou-lhe voltar um pouco a cabeça para ver o amigo de Estácio a alguns passos de distância.
- Estava aí? - perguntou Helena, estremecendo.
- Dona Úrsula não voltou - respondeu Mendonça com timidez -; não quis interromper a leitura que a senhora fazia.
- A leitura? A leitura acabou há muito tempo.
- Mas também se lê de cor.
Helena lançou-lhe um olhar suspeitoso.
- Não sei ler de cor - disse ela, erguendo-se e saindo da varanda.
Mendonça ficou aturdido. Que lhe dissera ele tão grave que a pudesse ofender? Repetiu as próprias palavras e não lhes achou sentido mau. Certo, porém, de que a molestara, ali ficou aborrecido de si mesmo, desejoso de lhe explicar tudo, se alguma cousa houvesse explicável. Após alguns instantes, resolveu entrar também. Entrou; Helena não estava nem na sala de jantar, nem na do jogo, onde achou D. Úrsula com o Dr. Matos e o coronel-major. Dali passou à sala de visitas. Helena não o viu entrar; estava mergulhada numa poltrona com a cabeça nas mãos. Comovido, deteve-se alguns instantes a contemplá-la; depois caminhou para ela e falou-lhe.
Helena ergueu a cabeça.
- Perdoe-me - disse ele -, se alguma cousa lhe disse que a magoou. Confesso que não sei o que poderia haver em minhas palavras. Ficou triste por isso?
A moça cravou nele um olhar ainda suspeitoso, e não lhe respondeu logo. Mendonça adotou o melhor dos alvitres naquela ocasião; inclinou-se e recuou para sair. Helena chamou-o; ele aproximou-se outra vez, com um ar de tão doce resignação que lisonjearia o mais levantado orgulho. Helena estendeu-lhe a mão; ele apertou-a e teve ímpetos de a beijar uma e muitas vezes, triunfando naquele único instante da hesitação de todos os dias; faltou-lhe resolução. Helena mostrou-lhe o trecho da carta em que Estácio se referia a ele; falaram dos ausentes e dos presentes, de todos e de tudo, menos do assunto que exclusivamente preocupava o moço. Ele saiu dali sem haver dito nada de seu coração. Chegando à rua, achou-se poltrão e ridículo, disse mil nomes feios a si próprio; enfim, prometeu declarar tudo a Helena no dia seguinte.
No dia seguinte, que era domingo, Helena dirigiu-se à capela a ouvir a missa do padre Melchior. Acabada a cerimônia, não seguiu para casa, com D. Úrsula, mas foi ter à sacristia, onde o padre acabava de tirar os paramentos. Melchior, logo que soubera da carta de Estácio, nessa manhã, pedira a Helena que lha deixasse ver.
- Falam sempre ao coração as letras dos amigos - dissera ele.
Helena deu-lhe a carta, que o padre recebeu com uma expressão antes de curiosidade que de afeto. Leu-a vagarosamente, como escrutando o sentido e as palavras; e, sendo longa a epístola, longo foi o tempo que ele despendeu em a interpretar. Durante esse tempo, Helena admirava-lhe a figura austera, a serenidade religiosa. A sacristia era pequena; duas altas janelas deixavam entrar a luz, o ar e o aroma das folhas e das flores da chácara. Entre a cimalha e o telhado algumas andorinhas haviam fabricado os ninhos, donde saíam, como pensamentos de juventude, a adejar ao sol da manhã. Ao pé daquele quadro exterior de alegria e verdura, a sacristia tinha certo ar melancólico e severo, que lançava n'alma o esquecimento das vicissitudes humanas. Helena deixou-se cativar desse sentimento de abstenção e elevação; se alguma dor ou remorso a pungia, esqueceu-os, por um minuto ao menos, entre aquelas paredes desataviadas, diante de um padre, entre uma imagem de Jesus e as obras vivas do Criador.
Lida a carta, Melchior dobrou-a com ar pensativo; depois entregou-a à moça.
- Já respondeu? - perguntou ele.
- Já; trouxe-lhe a carta que vou mandar hoje mesmo.
Melchior abriu-a e leu; não gastou menos tempo, ainda que era de menores dimensões. O estilo era afetuoso, mas muito menos exuberante que o da carta de Estácio. Ela contava-lhe, em suas feições gerais, a vida que ali passavam, desde que ele partira, as ocupações de cada dia e as distrações da noite.
Vivemos - dizia a moça - como podem viver duas criaturas que sabem a afeição que lhes tem um parente amigo, ausente embora, mas não esquecido - nem ingrato. O padre Melchior, algum dos vizinhos, e o Dr. Mendonça são as nossas visitas habituais. Você sabe o que vale o padre; é a mais bela alma que Deus mandou ao mundo. Os vizinhos são afáveis, como sempre. O Dr. Mendonça é verdadeiramente digno da nossa afeição e confiança. Disse-lhe o que você me escreveu; ele riu, como homem seguro de escapar à punição.
Pena é que você tenha de se demorar aí tanto tempo; mas, se alguma esperança pode haver de salvar a doente, damo-nos por bem pagas da demora. É verdade que você não é médico; mas há aí outra doente, para quem é, não só médico, mas até toda a medicina. Por que razão me não escreveu Eugênia? Eu não cuidei que essa amiga me esquecesse na véspera de ser minha cunhada. Se estivéssemos mais perto, ia puxar-lhe as orelhas. Diga-lhe isto; e se tiver ocasião de emprestar-me os seus dedos, aplique-lhe o castigo, declarando-lhe o delito cometido e o juiz que a sentenciou.
O que você diz da vida solitária é muito justo, mas impraticável. Os amigos não nos iriam ver; e poderíamos nós dispensá-los? Tal é a opinião de titia e a minha. O melhor de tudo é este meio-termo de Andaraí; nem estamos fora do mundo, nem no meio dele. O ruído externo pode ter os efeitos de que você fala; mas ele é às vezes preciso para aturdir e distrair o espírito. Também a solidão tem suas dores, e fundas; também ela abala o coração. Nem um extremo nem outro.
A carta continha alguns períodos mais, não muitos; três ou quatro vezes falava em Eugênia, com tamanha insistência que punha em relevo o silêncio a tal respeito conservado por Estácio; falava-lhe da beleza da noiva, do casamento próximo, do amor que os faria felizes, e da ventura que ambos dariam a todos os seus.
Quando o padre acabou de ler a resposta, abriu os braços a Helena; depois abrangeu com as mãos a cabeça da moça e contemplou-a durante alguns segundos.
- Toda a sua alma está nesse escrito - disse ele -; vejo aí a reflexão e o afeto. Tanto melhor! Há contudo uma lacuna: não transmite a seu irmão as minhas saudades; há também uma excrescência: louva méritos que não possuo. Embora! Mande-a...
- Escreverei duas linhas mais.
- Pois sim. Diga-lhe que se apresse, porque estou velho e posso morrer antes.
- Oh! - protestou Helena.
Melchior olhou para ela silenciosamente.
- Crê que Estácio seja feliz? - perguntou ele enfim.
- Creio.
- Também eu.
Outro silêncio. O primeiro que o rompeu foi o padre.
- Por que se não casa também? - disse ele.
- Eu?
- Decerto. Pode ser que muito breve, talvez...
- Talvez nunca.
Melchior franziu a testa; a fisionomia, de ordinário meiga, tornou-se severa, como a consciência dele. O padre tinha uma das mãos de Helena entre as suas; deixou-a insensivelmente cair. Entre os dous estabeleceu-se um silêncio que os acabrunhava e que não ousavam romper; como subjugados por um mistério, receava cada um deles que o outro lho lesse na fronte; instintivamente desviaram os olhos.
Melchior foi o primeiro que voltou a si. A reflexão corrigiu a espontaneidade, e o padre reassumiu o gesto usual, com essa dissimulação que é um dever, quando a sinceridade é um perigo.
- Vamos lá - disse ele -; ninguém pode decidir o que há de fazer amanhã; Deus escreve as páginas do nosso destino; nós não fazemos mais que transcrevê-las na terra.
- É verdade! - confirmou ela com um gesto de cabeça, e sem erguer os olhos.
- Amanhã - continuou o padre - o acaso - isso a que os incrédulos chamam acaso, e que é a deliberação da vontade infinita - lhe apontará um homem digno da senhora, e seu coração lhe dirá: é este; e o suspiro desalentado de hoje converter-se-á num olhar de graças ao céu. Ora, o que eu lhe peço, o que eu desejo, é que se apresse tanto que eu possa casá-los...
- Oh! Mas não vai morrer amanhã - interrompeu Helena.
- Estou velho, minha filha; estes cabelos brancos são já a neve desse mar polar para onde navegamos todos. Conto sessenta anos. A morte pode colher-me um dia próximo...
- Vamos almoçar - disse Helena sorrindo.
Saíram da sacristia, atravessaram a capela, e penetraram na chácara. Na ocasião em que iam transpor a porta da capela, viram Mendonça entrar em casa. Melchior estacou e olhou para Helena. Esta ia como acabrunhada e absorta. O gesto do padre, quando ela lhe declarou que não se casaria talvez nunca, ficara-lhe gravado na memória, como um enigma, que talvez receava decifrar. Poucos minutos eram passados; contudo, ela pôde refletir, e coligir os elementos de uma resolução. Detendo-se, com o padre, à porta da capela, viu também entrar Mendonça. Os olhos da moça e do padre interrogaram-se de novo, mas desta vez nenhum deles os desviou.
- Vê aquele homem? - perguntou Helena. Parece-lhe que seria bom marido?
- Excelente, decerto - disse vivamente Melchior -; caráter, educação, sentimentos...
- Tem ainda uma virtude particular: ama-me.
- Sei.
- Ele lho disse?
- Não, mas vê-se. É sabido de todos os que frequentam esta casa. A probabilidade do casamento é objeto de comentários, e a opinião geral é que ele se fará dentro de pouco tempo. Confessou-lhe alguma cousa?
- Nada; mas os olhos da mulher amada não são menos sagazes que os dos padres amigos. Acha que devo confirmar a opinião dos outros?
- Acho; consulte, porém, seu coração.
- Já consultei.
- Neste único instante?
- Nada menos.
- Deveras? - disse Melchior, derramando um olhar de paternal ternura no rosto sério de Helena.
- Não digo que o ame desde já; mas a afeição que ele me tem refletirá em meu coração, e eu virei a amá-lo. O que importa saber é que é digno de mim. De todos os que me pretendessem nenhum lhe seria superior.
- Ainda bem! Contudo, repare que vai contrair uma obrigação perpétua, e que um contrato destes não pode ser deliberado em poucos instantes.
- Oh! Nesse ponto a minha ignorância sabe mais do que a sua teologia. Que são minutos e que são meses? Paixões de largos anos, chegando ao casamento, acabam muitas vezes pela separação ou pelo ódio, quando menos pela indiferença. O amor não é mais que um instrumento de escolha; amar é eleger a criatura que há de ser companheira na vida, não é afiançar a perpétua felicidade de duas pessoas, porque essa pode esvair-se ou corromper-se. Que resta à maior parte dos casamentos, logo após os anos da paixão? Uma afeição pacífica, a estima, a intimidade. Não peço mais ao casamento, nem lhe posso dar mais do que isso.
- Não gosto de tanta reflexão em tão verde idade - replicou benevolamente Melchior -; todavia, encanta-me esse raciocínio que, ao cabo de tudo, pode ser verdadeiro. Mas não me desdigo; alguns minutos é pouco tempo; reflita ainda vinte e quatro horas.
- Nem um instante mais - insistiu Helena -. Minhas reflexões são lentas ou súbitas: ou cinco minutos ou um ano; escolha.
- Pois reflita cinco minutos - replicou o padre sorrindo.
- Já lá vão quatro; aproveitarei o último para lhe dizer que em nada disto falaria, se não fossem as qualidades notáveis desse moço; e para acrescentar que a ele me liga certa simpatia de gênios... é talvez a semente do amor.
Tinham chegado ao primeiro degrau da escada da varanda. Subiram e penetraram na sala de jantar, onde acharam D. Úrsula e Mendonça, este a percorrer com os olhos um jornal do dia. O almoço serviu-se imediatamente.
- Padre-mestre - disse D. Úrsula -, demorou-se tanto que cuidei... tivesse ideia de me arrebatar Helena.
- Estive-a ouvindo de confissão - respondeu Melchior.
- E pôde absolvê-la?
- Decerto.
- Mas com grande penitência, não?
- A mais fácil de todas - acudiu Helena, olhando para o padre.
- Oh! Então é que os pecados são leves! - concluiu D. Úrsula -. Não lhe parece?
Estas últimas palavras foram dirigidas a Mendonça, na ocasião em que todos caminhavam para a mesa. Mendonça não respondeu nada. Contra o costume, falava pouco - menos ainda que na véspera e nos dias anteriores. Dona Úrsula via a diferença mas não a compreendia.
- Não quero saber que pecados confessou - disse ela sentando-se -; estou certa de que o maior deles não levaria ninguém ao purgatório.
- Veja o que é uma tia indulgente - observou Helena a Mendonça, sentando-se ao seu lado.
Preocupado com a conversa que acabava de ter na sacristia e na chácara, Melchior pouca atenção prestou a princípio ao filho do comerciante. Analisava as circunstâncias do momento e pesava a responsabilidade que lhe podia vir de qualquer resolução que adotasse. Após um longo diálogo com a consciência, o velho sacerdote inclinou os olhos ao mancebo, que lhe ficava defronte, ao lado de Helena. Viu-os conversar. Ela mostrava-se graciosa, solícita e atenta, como uma esposa amante; ele parecia enamorado da voz e das falas da donzela; como que um clarão interior lhe desvendara à alma os horizontes infinitos da esperança. Familiarizado com Helena, tratado por ela com esquisita atenção, era contudo a primeira vez que ela lhe falava, não como a um confidente amigo, mas como a um homem que poderia vir a ser seu esposo. Alguma seriedade, um olhar submisso, uma atenção continuada, fizeram essa diferença, que antes foi sentida pelo coração do que descoberta pelos olhos.
No fim do almoço, Melchior dirigiu-se para a sala de visitas, com Helena. Mendonça acompanhou-os. A resolução do padre estava assentada de raiz; ele aceitava aquele casamento como um presente do céu. Apenas entrados na sala, travou as mãos de um e outro e lhes disse, com voz comovida:
- Prometem não zangar-se comigo?
- Por quê? - interrogou Mendonça com os olhos.
Helena baixara os seus.
- Prometem?
- Padre-mestre... - começou Mendonça sem poder concluir a frase.
O padre olhou silenciosamente para um e outro. Talvez hesitava falar; talvez buscava o melhor meio de dizer o que tinha no coração. Urgia romper o silêncio; fê-lo com solenidade:
- Serei duas vezes padre: segundo a natureza e segundo o Evangelho. Quando duas criaturas se merecem, é servir a Deus emprestar a voz ao coração que não ousa falar. O senhor ama esta menina; leio-lhe nos olhos o sentimento que o arrasta para ela; são dignos um do outro. Se é a timidez que lhe fecha os lábios, eu sou a voz da verdade e do amor infinito; se outro motivo, serei juiz complacente para escutá-lo.
Ouvindo estas palavras, Mendonça ficou aturdido e mudo. Não só a fortuna lhe chegava às mãos, quando ele menos esperava, mas até escolhera um caminho desusado e estranho. A realidade confundia-se ali com o sonho. A presença de um terceiro era suficiente motivo para acanhar os mais resolutos; acrescia a veste sacra do sacerdote, que dava àquilo um ar de solenidade e consagração. Mendonça recobrou, enfim, o uso dos sentidos; a resposta única e eloquente foi estender a mão a Helena, gesto a que a moça correspondeu com simpleza e naturalidade.
- Não se enganaram meus olhos - disse o padre -. Ama-a, e pode dar-lhe a felicidade que lhe desejo a ela. Também Helena o fará venturoso, não? - perguntou ele, voltando-se para a moça.
- Mas é isto um sonho? - perguntou enfim Mendonça.
- A vida não é outra cousa - retorquiu o capelão -; velho pensamento e velha verdade. Façamos por que o sonho seja agradável e não árido ou triste. Prometem-me que se farão felizes?
- Não ambiciono outra cousa - disse o rapaz -; será o meu cuidado e a minha glória.
- Seu amor - continuou Melchior - é mais forte que o de Helena; eu consultei-a antes, e li em seu coração. Elege-o com prazer, embora sem entusiasmo. Não é a paixão cega que a faz falar; é um sentimento brando e singelo, por isso mesmo duradouro. A reflexão de um corrigirá a violência do outro e os dous sentimentos se completarão pela virtude especial de cada um.
Esta explicação franca de Melchior teve o condão de ser agradável aos dous. Helena estimou que ele nem lisonjeasse as ilusões de Mendonça, nem a desse como aceitando indiferente e estouvada o casamento proposto. Pela sua parte, Mendonça viu nas palavras do padre um indício da sinceridade de Helena, e aceitou o pouco oferecido, com a certeza de multiplicá-lo. O caráter de Melchior e a veneração que mereciam suas virtudes eram fianças de veracidade e davam ao ato singelo que ali se passava um forte cunho de santidade e elevação. Não era uma vulgar declaração de amor, sujeita às variações do espírito ou do interesse, mas verdadeiros esponsais em que a religião era inspiradora e testemunha.