No momento em que começa esta narrativa, tinha Luís Garcia quarenta e um anos. Era alto e magro, um começo de calva, barba rapada, ar circunspecto. Suas maneiras eram frias, modestas e corteses; a fisionomia, um pouco triste. Um observador atento podia adivinhar por trás daquela impassibilidade aparente ou contraída as ruínas de um coração desenganado. Assim era; a experiência, que foi precoce, produzira em Luís Garcia um estado de apatia e cepticismo, com seus laivos de desdém. O desdém não se revelava por nenhuma expressão exterior; era a ruga sardônica do coração. Por fora, havia só a máscara imóvel, o gesto lento e as atitudes tranquilas. Alguns poderiam temê-lo, outros, detestá-lo, sem que merecesse execração nem temor. Era inofensivo por temperamento e por cálculo. Como um célebre eclesiástico, tinha para si que uma onça de paz vale mais que uma libra de vitória. Poucos lhe queriam deveras, e esses empregavam mal a afeição, que ele não retribuía com afeição igual, salvo duas exceções. Nem por isso era menos amigo de obsequiar. Luís Garcia amava a espécie e aborrecia o indivíduo. Quem recorria a seu préstimo, era raro que não obtivesse favor. Obsequiava sem zelo, mas com eficácia, e tinha a particularidade de esquecer o benefício, antes que o beneficiado o esquecesse.