Eugênia ouviu calada as palavras do moço; não as entendeu muito. Sabia-lhes a significação; não lhes viu porém nexo nem sentido; sobretudo, não lhes sentiu a aplicação. O que a irritou mais foi o tom pedagogo de Estácio; estouvada e voluntariosa, não admitia que ninguém lhe falasse sem submissão ou a repreendesse por atos seus, que ela julgava legítimos e naturais. A insistência do moço foi o ponto de partida a um desses arrufos, não raros entre amantes, e comuns entre aqueles dous. Os de Eugênia não eram simples silêncios; seu espírito rebelde e livre não adormecia nesses momentos de enfado; pelo contrário, irritava-se e traduzia a irritação por meio de pirraças e acessos de mau humor. Estácio viu murmurar, crescer e desabar a tempestade. A moça articulava algumas frases soltas, batia no chão com o pezinho mimoso, que por acaso esmagou uma pobre erva, alheia às divergências morais daquelas duas criaturas. Ora parava e desandava o caminho; mas logo se dirigia para o moço, com as pálpebras trêmulas de cólera e um remoque nos lábios; comprazia-se em torcer a ponta da manga ou morder a ponta do dedo. Estácio, afeito a essas explosões, não lhes sabia remédio próprio: tanto o silêncio como a réplica eram ali matérias inflamáveis. Contudo, o silêncio era o menor dos dous perigos. Estácio limitava-se a ouvir calado, olhando à sorrelfa para a filha de Camargo, cujo rosto parecia mais belo quando a raiva o coloria. Uma terceira pessoa era a única esperança de pacificação; Estácio alongou o olhar pelo jardim em busca desse deus ex machina. Apareceu ele enfim sob a forma de um Carlos Barreto - estudante de medicina -, que cultivava simultaneamente a patologia e a comédia, mas prometia ser melhor Esculápio que Aristófanes. Mal os viu de longe, apertou o passo para o grupo.